Diz diretor do Sírio-Libanês
Porto Alegre perdeu, neste ano, o Hospital Parque Belém. O Beneficência Portuguesa, com mais de 160 anos de história, definha. A crise na saúde provoca a restrição de atendimento em outras instituições e deve ter como consequência o fechamento de outros hospitais, principalmente os pequenos, em cidades do Interior. É o que projeta o diretor-executivo do Sírio-Libanês, um dos mais importantes da América Latina, Fernando Torelly. Gaúcho de Porto Alegre, ex-superientende do Moinhos de Vento, Torelly é um destacado gestor de hospitais no país. Ele vê uma saída para a crise: o estabelecimento de redes entre as instituições. E a melhora de suas gestões.
Com a crise econômica, 3 milhões de brasileiros perderam planos de saúde e foram para o SUS. O gasto com saúde é muito elevado. Os planos estão reajustando até o dobro da inflação. Os hospitais estão reduzindo sua margem operacional, os médicos reclamam dos honorários ruins e os pacientes esperam demais nas emergências. O modelo atual de saúde suplementar precisa ser revisto, pois está desagradando a todos. A maioria das pessoas, quando precisa de atendimento, vai à emergência do hospital. Quando tu chegas à emergência, o médico não te conhece e te submete a exames que provavelmente teu médico não te pediria. Há uma discussão, hoje, em relação ao que é valor em saúde, ou seja, só fazer o que realmente se precisa fazer. Você não pode gastar menos a ponto de prejudicar o tratamento do paciente, mas tem de eliminar o desperdício.
O senhor pode dar um exemplo prático?
As indicações de cirurgia de coluna: quando os procedimentos são revistos por especialistas, mais de 50% são recomendados a não operar e, em vez disso, fazer reabilitação e exercícios. “Pertinência” é uma palavra fundamental no sistema de saúde. É pertinente fazer? Ou não?
Ser pertinente pode contrariar o diagnóstico médico?
Não se trata de fazer menos cirurgias a todo custo: o que tem que ser feito deve ser feito. Mas temos de fazer uma reflexão se é a melhor conduta em cada caso.
O grande problema na saúde é de gestão ou falta de dinheiro?
Falta de gestão e de financiamento. Mas temos de refletir: se a saúde suplementar no Brasil está em crise, por que o capital internacional quer investir aqui? Nossa saúde suplementar, bem gerida, com 2 mil a 3 mil leitos, pode ser rentável.
Nesse cenário, o que vai acontecer com o hospital pequeno?
O modelo de hospital que não trabalha em rede, que está isolado, é insustentável. A globalização está atingindo os hospitais. Você tem de ser grande ou integrado a uma rede.
Esse fenômeno pode melhorar o atendimento?
Quando a eficiência é priorizada com a redução de desperdícios, você tem mais possibilidade de investir na qualidade das pessoas e em equipamentos. O Moinhos de Vento é um exemplo: acabou de abrir mais leitos. Não tem mais como o hospital ser pequeno.
E os hospitais das cidades pequenas?
Terão de tentar trabalhar associados a outros hospitais, numa espécie de consórcio para diminuir custos e poder negociar com fornecedores. Também terão de definir seu perfil. Não dá, por exemplo, para ter maternidade em todos os hospitais.
O senhor prevê que hospitais vão fechar?
Sem dúvida. Não está fechando o Beneficência Portuguesa? O Parque Belém também fechou…
Como fazer negociações com indústrias poderosas como a farmacêutica?
Quando se compra mil unidades, há um desconto. Quando se compra 2 mil, mais ainda. Um hospital isolado paga o preço o cheio. É por isso que nós, aqui do Sírio- Libanês, nos articulamos com outros hospitais para comprar em conjunto. Acontecerá nos hospitais o mesmo que aconteceu nas farmácias.
A farmácia de esquina despareceu. Só existem as grandes redes.
E os hospitais públicos?
O Sírio-Libanês tem um projeto para implantar programas de excelência operacional em seis emergências do SUS no Brasil. E estamos fazendo um trabalho de apoio aos hospitais federais do Rio. Os hospitais públicos precisam seguir a mesma lógica dos privados: trabalhar de forma integrada, criando redes para comprar materiais.
Por que grandes hospitais enfrentam dificuldades em dar atendimento mais ágil em emergências?
É oferta versus demanda. Em Porto Alegre, a procura por emergências dobra a cada ano. E isso acontece porque o hospital investe em qualidade, e os pacientes sabem que serão bem entendidos.
Fonte: GaúchaZH
Data: 08/12/2017