A qualidade dos hospitais, laboratórios, médicos e profissionais vinculados aos planos de saúde será requisito para definir a dimensão dos reajustes pagos pelas operadoras para quem presta os serviços aos pacientes.
O modelo, que deve valer a partir de dezembro para os estabelecimentos de saúde, prevê conceder aumentos inferiores ao IPCA (índice oficial de inflação) para quem não se enquadrar em alguns fatores de qualidade.
A proposta da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) valerá para os casos em que não houver um índice de reajuste pré-definido em contrato nem acordo entre as partes. Mas já provoca reclamações no setor.
Pela fórmula, hospitais e estabelecimentos de saúde que tiverem uma acreditação –espécie de selo de qualidade fornecido por empresas especializadas– receberão reajuste equivalente a 100% do IPCA.
Quem estiver ainda em processo de avaliação, por sua vez, recebe um pouco menos: 90% do índice. Já prestadores sem selo ou certificação de qualidade ficariam com 80%.
Para Yussif Ali Mere, presidente do Sindhosp (sindicato de hospitais paulistas), a possibilidade de reajuste menor conforme esses critérios é “absurda”. “Nada contra usar a qualidade. Mas isso deveria ser algo a mais, não um redutor”, diz Ali Mere.
Segundo ele, menos de 10% dos hospitais do país possuem acreditação, cujos custos variam, em média, de R$ 60 mil a R$ 80 mil.
Hoje, não há uma regra que determine que os hospitais precisam buscar esse tipo de certificação.
MÉDICO DE QUALIDADE
Além dos hospitais, clínicas e laboratórios, esse fator de qualidade deve servir como parâmetro de reajuste para médicos e profissionais a partir de dezembro de 2017.
Os critérios ainda serão definidos em reuniões com entidades de cada categoria.
Uma das sugestões iniciais já apresentadas, por exemplo, é definir a qualidade por título de pós-graduação. Assim, especialistas receberiam 100% do índice, e não especialistas, 80%, por exemplo.
Para entidades médicas, a medida embute um modelo de “ranking” de profissionais.
“É muito difícil mensurar a qualidade de um profissional. Um médico com 100% de cesariana [procedimento indicado só em casos específicos], por exemplo, pode trabalhar só com gestação de alto risco. Vai ganhar menos?”, compara Márcio Bichara, secretário de saúde suplementar da Fenam (Federação Nacional de Médicos).
Para ele, a qualidade deveria ser um fator extra no reajuste –do contrário, diz, a medida pode afastar profissionais dos planos de saúde.
MUDANÇA DE CULTURA
A diretora da ANS Martha Oliveira rebate as críticas. Para ela, a resistência inicial das entidades é natural a uma “mudança de cultura”.
“Temos um sistema de financiamento ruim do setor, no modelo de quanto mais produzo. E nunca se introduziu a questão da qualidade. Queremos garantir isso”, diz.
Oliveira afirma que a diferença resultante da aplicação dos percentuais será pequena. No caso dos profissionais, diz, a agência deve atuar mais como mediadora da definição dos critérios de qualidade. “A ideia não é prejudicar ninguém, é estimular [a busca por qualidade] e fazer as pessoas verem essas informações.”
Segundo ela, assim que houver definição dos critérios detalhados, a agência quer ampliar a divulgação desses parâmetros ao consumidor.
Hoje, há alguns desses fatores em “caderninhos” de planos de saúde com a lista de prestadores de serviços, por meio de letrinhas. “Queremos tornar isso mais visível.”
Procurada, a FenaSaúde, entidade que representa planos de saúde, não respondeu aos pedidos da reportagem até noite desta terça-feira (8).
FATOR DE QUALIDADE PARA REAJUSTE
O que é
Proposta de que critérios de qualidade sejam considerados no índice de reajuste a ser pago por operadoras de planos de saúde a hospitais, laboratórios, clínicas
e profissionais
Como é a proposta
Ideia é aplicar o IPCA, principal índice de inflação, e dar reajustes que variam conforme a qualidade
Exemplo: quem tiver ‘selo’ de qualidade terá reajuste de 100% do IPCA. Quem estiver no meio do processo deve ter reajuste de 90%. Já prestadores sem certificado receberão 80%.
Quando vale
Deve ser aplicado apenas como ‘terceira via’, nos casos em que não há um índice pré-definido em contrato ou um acordo entre operadora e prestador de serviço
Impasses
Para entidades, medir qualidade pode levar a ranking ‘equivocado’ de prestadores de serviço
NÚMEROS DO BRASIL
OPERADORAS:
1.187 é o total
Destas:
855 são de planos médico-hospitalares
332 são de planos odontológicos
PLANOS:
33.715 são médico-hospitalares
3.137 são odontológicos
USUÁRIOS:
50,5 milhões de pessoas têm planos de saúde
Dados da ANS (dados até 31.ago.15), Fenam, Fehosp/Sindhosp e FBH
Fonte: Folha de São Paulo, artigo de NATÁLIA CANCIAN – 09/09/2015