Satisfação materna

Rev. Adm. Saúde  Vol. 17,  Nº 66, Jan. – Mar. 2017

 

ARTIGO ORIGINAL

 

Parto normal ou cesárea: a influência do tipo de parto desejado na satisfação materna quanto à assistência hospitalar ao nascimento

Normal delivery or cesarean section: the influence of desired type of birth on maternal satisfaction with hospital care for childbirth

 

Angela Maria Bacha1, Oswaldo da Rocha Grassiotto2, Denis Barbosa Cacique3, Helymar da Costa Machado4, Gislaine Aparecida Fonsechi-Carvasan5, Claudia Aparecida Batista de Souza6

 

1 Doutora em Tocoginecologia pela Unicamp; Docente do Departamento de Tocoginecologia da FCM/Unicamp – Campinas (SP), Brasil

2 Doutor em Tocoginecologia pela Unicamp; Vice-Reitor Executivo de Administração/Unicamp – Campinas (SP), Brasil

3 Bacharel em Filosofia e Mestre em Ciências da Saúde pela Unicamp; Assistente da Diretoria do Hospital da Mulher-Professor Dr. José Aristodemo Pinotti Caism/Unicamp – Campinas (SP), Brasil

4 Graduado em Estatística pela Universidade Federal de São Carlos e Mestre em Estatística pela Unicamp; Estatístico do Hospital da Mulher-Professor Dr. José Aristodemo Pinotti Caism/Unicamp – Campinas (SP), Brasil

5 Graduada em Estatística e Mestra em Saúde Coletiva pela Unicamp;  Estatística do Hospital da Mulher-Professor Dr. José Aristodemo Pinotti Caism/Unicamp – Campinas (SP), Brasil

6 Graduanda em Pedagogia (Licenciatura) pela Faculdade de Educação e bolsista do programa de Bolsa Auxílio Social do Serviço de Apoio ao Estudante/Unicamp – Campinas (SP), Brasil

 

 

RESUMO

O estudo objetivou avaliar a satisfação materna quanto à assistência hospitalar ao parto considerando-se o tipo de parto desejado e o realizado. Tratou-se de estudo descritivo, de corte transversal, com abordagem quantitativa e amostragem por conveniência em um hospital de ensino, em Campinas, São Paulo. 181 puérperas responderam, durante a internação, questionário contendo 18 questões. Pacientes internadas por mais dias apresentavam maior insatisfação para todos os domínios avaliados. Pacientes com menor nível socioeconômico estavam mais insatisfeitas com o parto. No comparativo entre parto desejado e realizado, os grupos mais insatisfeitos eram os de mulheres cuja via de parto desejada foi diferente da realizada:  mulheres que desejavam um parto normal e tiveram uma cesariana foram as mais insatisfeitas. Conclui-se que as diferenças de satisfação em relação à via de parto são estatisticamente significativas apenas quando se inclui na análise tanto o desejo da paciente como a via efetiva de parto. Face à problemática da cesariana no Brasil esse estudo contribui para uma melhor compreensão do excesso de cesarianas praticados no país bem como ajuda na busca de soluções adequadas para esse problema.

Palavras-chave: Satisfação do Paciente. Cesárea. Parto Normal. Parto Desejado. Alojamento Conjunto. Tempo de Internação.

 

ABSTRACT

The purpose of this study was to evaluate maternal satisfaction with hospital care for childbirth and postpartum hospitalization, considering the relationship between the desired and performed type of delivery. It was conducted a descriptive and cross-sectional study, with quantitative approach and convenience sampling, in a University hospital, in Campinas, São Paulo State. 181 women answered an interview during the stay in the rooming-in, based on a closed questionnaire containing 18 questions. Patients hospitalized for more days had greater dissatisfaction for all domains assessed. Patients with lower socioeconomic status were more dissatisfied with delivery than those with higher socioeconomic level. In the comparison between desired and performed type of delivery, the most dissatisfied group consisted of women whose desired and performed type of delivery didn’t match each other: women who wanted a natural birth and had a C-section were the most dissatisfied. We concluded that the differences of satisfaction according to the type of delivery are statistically significant only when the analysis includes both the desired and the performed type of delivery. This study contributes to a better understanding of excess cesareans in Brazil as well as can help in finding appropriate solutions to this problem.

Keywords: Patient Satisfaction; Cesarean Section; Natural Childbirth; Desired Birth; Rooming-in Care; Length of Stay.

 

 

 

INTRODUÇÃO

Gravidez, parto e puerpério constituem a principal causa de internação nos serviços públicos e privados de saúde brasileiros1. Nesse cenário, grande atenção deve ser dada à avaliação da satisfação das pacientes, iniciativa considerada um aspecto importante da humanização do parto2. Dar voz à mulher, permitindo-lhe manifestar-se sobre os pontos positivos e negativos da assistência, vai ao encontro do tão necessário reconhecimento do protagonismo da parturiente nesse momento marcante da vida. Além disso, conforme ressalta Donabedian, informações sobre a satisfação de pacientes são indispensáveis tanto para a avaliação da qualidade da assistência como para o próprio desenvolvimento e administração de serviços de saúde3.

Parte dos esforços dedicados à avaliação da satisfação sobre a assistência ao parto e ao pós-parto reside na investigação do conjunto de características que influenciariam a satisfação das pacientes. Alguns dos temas mais frequentemente incluídos nesse tipo de análise são a participação da gestante em diferentes programas de pré-natal, a qualidade da comunicação com a equipe de saúde, o papel da enfermagem durante o cuidado e o tempo de permanência na internação pós-parto4. Outros trabalhos têm procurado estabelecer relação entre a satisfação da parturiente e os métodos farmacológicos empregados para o alívio da dor5. E identificam-se, ainda, estudos voltados à avaliação da influência de características pessoais das mulheres sobre a satisfação, como idade, raça, escolaridade, estado civil, paridade e nível socioeconômico6.

Nesse conjunto de determinantes, destaca-se a relação entre satisfação e via de parto. Estudo realizado na Austrália, por exemplo, identificou diferenças estatisticamente significativas de satisfação entre os partos do tipo vaginal espontâneo (com a maior satisfação), cesárea eletiva (segunda maior), cesárea de emergência (terceira) e vaginal instrumental (quarta)7. Na Irlanda, estudo concluiu que pacientes que haviam realizado parto vaginal (com cesárea prévia) estavam mais satisfeitas do que aquelas que haviam realizado parto cesárea (com parto normal prévio) em relação às informações relacionadas ao pré-parto e ao parto em si8. Já uma pesquisa nacional verificou que a satisfação média para os dois tipos de partos era mesma, salientando-se que as pacientes que haviam realizado cesáreas estavam mais satisfeitas com o manejo da dor pós-parto, ao passo que aquelas que tinham realizado parto vaginal estavam mais satisfeitas com o controle da dor durante o trabalho de parto9.

O estudo da relação entre via de parto e satisfação das parturientes deve ter destacada relevância no Brasil, cuja taxa de cesáreas foi reconhecida pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância como uma das mais elevadas do mundo10. No país, dependendo do município e do tipo de financiamento analisados, a proporção de cesarianas supera 90% dos partos, com crescimento constante ao longo dos últimos anos11. O temor materno em relação à dor e ao trabalho de parto, a preocupação parental com o bem-estar fetal, eventuais experiências negativas com partos anteriores e a conveniência de se agendar o parto são alguns dos motivos apontados como determinantes da alta incidência de cesarianas12. No centro dessa discussão, portanto, juntamente com outros fatores, está a preferência da mulher por determinada via de parto. Todavia, embora existam estudos que procurem identificar e enumerar os componentes dessa preferência13, bem como outros que enfatizem a importância da participação da mulher nas decisões referentes ao parto4, não se encontram na literatura pesquisas que relacionem a satisfação da puérpera com as vias de parto desejado e realizado.

Diante dessas considerações, o objetivo do presente estudo consistiu em avaliar a satisfação de puérperas em relação ao parto e à internação pós-parto em um hospital situado na região metropolitana de Campinas, São Paulo. Como objetivo específico, o estudo pretendeu comparar os níveis de satisfação entre mulheres que haviam realizado parto vaginal e cesariano. Também foram comparados os níveis de satisfação segundo o tipo de parto desejado (normal ou cesárea), verificando, ainda, se haveria diferença de satisfação caso o parto efetivamente realizado não fosse igual àquele desejado pela paciente.

 

MÉTODOS

A pesquisa foi realizada no ano de 2014, em um hospital de ensino, público, que atende exclusivamente pelo SUS e que é referência para o acompanhamento da gravidez e do parto de alto risco. A instituição integra a Rede Cegonha e detém certificação da Iniciativa Hospital Amigo da Criança, estimulando, dentre outros cuidados, o incentivo ao aleitamento materno logo após o nascimento, a presença de acompanhante (antes, durante e após o parto) e a utilização seletiva e não rotineira de procedimentos invasivos (como, por exemplo, a episiotomia). O serviço realiza aproximadamente 2.800 partos por ano, para os quais dispõe de 15 leitos de terapia intensiva e 15 de cuidados intermediários neonatais, 6 de UTI adulto, 20 de internação clínica durante a gravidez e 24 de puerpério em sistema de alojamento conjunto.

Tratou-se de estudo descritivo, de corte transversal, com abordagem quantitativa e amostragem por conveniência. O cálculo do número de sujeitos utilizou técnica de amostragem para estimação de proporção de população finita14, assumindo-se para p (proporção de pacientes satisfeitas) o valor de 0,5. A população considerada para esse cálculo consistiu na média trimestral de internações na enfermaria do Alojamento Conjunto (557 pacientes). O erro amostral foi de 6% e o nível de significância igual a 5%. Com isso, o tamanho amostral foi de 181 sujeitos.

A coleta de dados foi realizada diariamente por entrevistadores nas Enfermarias de Alojamento Conjunto, unidade de internação que admite mulheres em pós-parto, que estejam amamentando e cujos recém-nascidos possam permanecer com elas. Podiam participar do estudo puérperas de qualquer idade, com pelo menos 24 horas de internação no Alojamento Conjunto, que não estivessem recebendo atendimento médico ou da enfermagem no momento da entrevista e que consentissem com a participação no estudo. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp (Parecer nº 496/2011), que dispensou a utilização do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido após entendimento de que a identificação das participantes poderia inibir o ingresso no estudo ou comprometer a veracidade das informações fornecidas.

O questionário utilizado nas entrevistas possui 18 questões, respondidas mediante uma escala do tipo Likert com os seguintes pesos: “ruim”=1, “médio”=2, “bom”=3 e “excelente”=4. O escore de satisfação de cada participante foi obtido somando-se os valores das respostas e dividindo-se o resultado pelo número de questões respondidas, o que gerou uma média. A seguir, essa média foi convertida em uma escala de 0 a 100 pontos, de tal modo que, quanto maior fosse o escore, melhor seria a satisfação. A transformação da média na escala de 0 a 100 pontos utilizou a seguinte fórmula: escore=(média dos itens–1)/(4–1)x100. Para o escore total, foram utilizadas as 18 questões, ao passo que, para os domínios, a média foi calculada de acordo com a composição de cada um deles.

As questões foram agrupadas em quatro domínios: “Pronto Atendimento”, “Parto”, “Relacionamento Interpessoal” e “Organização do Serviço”. O primeiro deles inclui questões sobre a admissão da paciente via Pronto Atendimento, como o tempo de espera e a educação do médico e do enfermeiro. O domínio “Parto” aborda aspectos como a presença de acompanhante durante o parto e os procedimentos realizados para aliviar a dor. O “Relacionamento Interpessoal” trata de questões diretamente relacionadas à interação com os profissionais da saúde, como a clareza das orientações e a delicadeza da equipe no cuidado da puérpera e do recém-nascido. Finalmente, a “Organização do Serviço” aborda aspectos físicos do local de internação (como temperatura do quarto e conforto da cama) e características relacionadas à organização do serviço (como o respeito à privacidade, limpeza e nível de ruídos). A composição desses domínios inspirou-se no modelo teórico de Donabedian, que estabelece um conjunto de categorias (“structure”, “process” e “outcome”) para avaliar a qualidade do cuidado na área da saúde3.

Além das questões diretamente relacionadas à satisfação das pacientes, foram coletados dados sobre o tempo de internação (em dias), idade (em anos), número de gestações, escolaridade, estado civil, tipo de parto realizado (vaginal ou cesárea) e tipo de parto inicialmente desejado pela paciente (normal ou cesárea). A classificação socioeconômica baseou-se na pontuação estabelecida pelo Critério de Classificação Econômica Brasil da Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa15.

Os dados coletados foram submetidos ao teste de Shapiro-Wilk16, verificando-se que a distribuição dos escores de satisfação não era normal. A descrição da amostra foi realizada por meio de tabelas de frequência e do cálculo de estatísticas descritivas: média, desvio padrão, mediana e valores mínimo e máximo. A comparação entre os níveis de satisfação e as variáveis categóricas empregou o teste de Mann-Whitney (para variáveis com dois grupos) e o teste de Kruskal-Wallis (para variáveis com três ou mais categorias)17.

Quanto ao questionário empregado, para testar a hipótese da composição fatorial da escala de satisfação das pacientes em quatro domínios, utilizou-se análise fatorial confirmatória, via modelo de equações estruturais para variáveis latentes18. A consistência interna geral e por domínio foi avaliada por meio do coeficiente alfa de Cronbach, considerando-se que o questionário teria boa consistência para resultados maiores que 0,7019, 20. A validação concorrente (ou “de critério”) do escore geral e de cada um de seus domínios foi avaliada correlacionando-os com uma questão respondida à parte pelas pacientes (“como você avalia a internação como um todo”). Para isso, utilizou-se o coeficiente de correlação de Spearman, considerando-se que valores elevados indicariam uma validação concorrente satisfatória21. Todos os testes estatísticos foram realizados por meio do software SAS versão 9.2, adotando-se o nível de significância de 5%, ou seja, P<0,05.

 

RESULTADOS

A caracterização socioeconômica das participantes consta da Tabela 1. A amostra constituiu-se de 181 mulheres, com idade média de 25,5 anos. Em relação à escolaridade, pouco mais da metade delas possuíam pelo menos o nível médio completo.

 

Tabela 1. Caracterização da amostra segundo idade, escolaridade, estado civil, classificação socioeconômica, tipo de parto realizado e desejado, presença de acompanhante, planejamento da gravidez, números de gestações e de filhos e tempo de internação.

Variáveis

n (%)

Idade (anos)

Média (desvio padrão)

25,5 (7,2)

Mediana (mínimo; máximo)

24,0 (14,0; 44,0)

Escolaridade

Analfabeto / Fundamental I incompleto

1 (0,6)

Fundamental I completo / Fundamental II incompleto

31 (17,1)

Fundamental II completo / Médio incompleto

56 (30,9)

Médio completo / Superior incompleto

83 (45,9)

Superior completo

10 (5,5)

Estado civil

Solteira

32 (17,7)

Casada ou mora com o companheiro

145 (80,1)

Divorciada

4 (2,2)

Critério Brasil/Classificação socioeconômica

D-E (pobres e extremamente pobres)

19 (10,5)

C2 (vulneráveis)

46 (25,6)

C1 (baixa classe média)

69 (38,3)

B2 (média classe média)

43 (24,0)

B1 (alta classe média)

2 (1,1)

A (classe alta)

1 (0,5)

Parto realizado

Vaginal

115 (63,5)

Cesárea

66 (36,5)

Parto desejado

Normal

134 (74,0)

Cesárea

33 (18,2)

Indiferente

14 (7,8)

Presença de acompanhante durante o parto

Sim

147 (81,2)

Não

34 (18,8)

Número de gestações

Primigesta

80 (44,2)

Não primigesta

101 (55,8)

Duração da internação (dias)

Média (desvio padrão)

2,6 (2,0)

Mediana (mínimo; máximo)

2,0 (1,0; 14,0)

NOTA: Amostra total de 181 mulheres. Uma participante não respondeu as questões para classificação socioeconômica.

 

A maioria era casada ou morava com o companheiro. E quase 75% da amostra se concentravam entre as classes C, D e E. O tempo médio de internação no momento da entrevista era de 2,6 dias. A maioria das mulheres (74,0%) desejava ter realizado um parto normal, enquanto 18,2% preferiam a cesariana e as demais não tinham preferência. Quanto aos partos efetivamente realizados, 63,5% foram vaginais e 36,5% cesarianos. A maioria das participantes contou com a presença de acompanhantes durante o parto, com 81,2% da amostra.

Os dados sobre a validade concorrente, estrutura fatorial, consistência interna do questionário e escores de satisfação por questão e por domínio constam da Tabela 2. A validação concorrente obteve valores satisfatórios para o escore geral do questionário e para os domínios “Parto”, “Relacionamento Interpessoal” e “Organização do Serviço”. Todas as questões obtiveram carga fatorial maior que 0,30 para seus respectivos domínios, sempre com significância estatística. A consistência interna obteve valores acima de 0,70 para os quatro domínios do instrumento, assim como para o escore geral.

 

Tabela 2. Questionário de avaliação da satisfação das pacientes internadas no Alojamento Conjunto, segundo composição dos domínios, cargas fatoriais de cada item, coeficiente alfa de Cronbach, validação concorrente e escores de satisfação geral, por domínio e por questão.

Domínios e respectivos itens avaliados

Carga Fatorial

Valor de t

Alfa de Cronbach

Validação Concorrente **

Escore Médio

Desvio Padrão

Pronto Atendimento

0,728

0,555

68,7

21,4

Atendimento na recepção do Pronto Atendimento

0.654

7.52*

67,6

25,6

Educação do médico e do enfermeiro do PA

0.849

10.41*

79,8

20,9

Tempo de espera no Pronto Atendimento para a internação

0.579

6.48*

 

 

58,5

33,2

Parto

0,726

0,629

81,6

19,1

Ajuda dos profissionais durante o parto

0.724

8.46*

82,4

23,0

Presença de acompanhante durante o parto

0.792

9.45*

83,5

20,8

Procedimentos realizados para aliviar a dor durante o parto

0.548

6.01*

 

 

77,2

28,2

Relacionamento Interpessoal

0,894

0,638

84,1

16,2

Educação dos profissionais do Alojamento Conjunto

0.775

10.04*

84,4

18,1

Clareza das informações recebidas sobre a sua saúde

0.716

8.98*

82,0

21,5

Orientações sobre como amamentar, dar banho e segurar o bebê

0.858

11.73*

86,5

17,2

Delicadeza com que médicos e enfermeiros cuidam de você e do bebê

0.919

13.15*

86,9

17,8

Agilidade do atendimento no hospital

0.712

8.91*

 

 

81,2

22,3

Organização do Serviço

0,894

0,690

75,8

16,2

Alimentação servida a você

0.694

8.57*

78,8

21,9

Limpeza do hospital (chão, roupas, lençol, banheiro e corredores)

0.668

8.14*

78,1

21,2

Conforto da cama (colchão, travesseiro, lençol e cobertor)

0.827

11.01*

80,5

20,2

Temperatura do quarto

0.362

4.00*

57,1

32,5

Respeito a sua privacidade

0.778

10.04*

79,8

20,4

Presença de barulhos

0.712

8.88*

74,2

26,5

Segurança dentro do hospital

0.826

10.99*

82,4

17,8

Escore Geral do Questionário

 

 

0,935

0,742

77,9

14,9

Questão extra: como você avalia a internação como um todo?

82,1

19,1

NOTA: Todos os itens se iniciavam com a questão “Como você avalia a/o...” e podiam ser respondidos mediante a seguinte escala do tipo Likert: ruim, médio, bom e excelente.

* Valores significativos das cargas padronizadas dos itens (p<0.05) para valor de t>1.96, segundo análise fatorial confirmatória.

** Coeficiente de correlação de Spearman.

 

Com relação aos escores de satisfação por questão e domínio, o “Relacionamento Interpessoal” e o “Parto” obtiveram as melhores avaliações, ambos com escores acima de 80 pontos. Já o “Pronto Atendimento” obteve a pior avaliação, seguido pela “Organização do Serviço”. A satisfação geral foi de 77,9 pontos e a questão extra sobre como a paciente avaliava a internação como um todo obteve 82,1 pontos. Aprofundando-se a análise para examinar individualmente cada questão, verifica-se que os três aspectos mais bem avaliados estavam diretamente ligados à relação entre as mulheres entrevistadas e os profissionais da saúde, incluindo a delicadeza de médicos e enfermeiros, as orientações recebidas e a educação da equipe no Alojamento Conjunto. Dentre os itens menos bem avaliados, dois estavam relacionados ao Pronto Atendimento, incluindo o tempo de espera para internação e o atendimento na recepção. O aspecto com pior avaliação foi a temperatura do quarto no Alojamento Conjunto.

O tempo de internação influenciou a satisfação das pacientes, conforme Tabela 3. De modo geral, houve uma redução expressiva da satisfação a partir do terceiro dia de internação, quer em relação ao segundo dia, quer em relação ao primeiro. Nos domínios “Pronto Atendimento” e “Parto”, a diminuição da satisfação é significativa no comparativo entre o primeiro e o terceiro dias de internação. Já em “Relacionamento Interpessoal” e “Organização do Serviço”, nota-se uma redução significativa da satisfação na passagem do segundo para o terceiro dia. Essa tendência também se observa em relação à satisfação geral das pacientes, com diferença estatisticamente significativa de 7,4 pontos entre o segundo e o terceiro dia de internação.

 

Tabela 3. Satisfação das pacientes em relação ao tempo de internação no momento da entrevista.

Domínios Avaliados

1 dia

2 dias

≥3  dias

Valor-P

n=57

n=53

n=71

 

Pronto Atendimento

0,020

Média (desvio padrão)

73,3 (19,3)

71,2 (20,3)

62,9 (22,8)

Mediana

77,8*

66,7

66,7*

Mínimo; Máximo

(22,2; 100,0)

(22,2; 100,0)

(0,0; 100,0)

Parto

0,012

Média (desvio padrão)

85,2 (16,2)

84,7 (18,7)

76,3 (20,5)

Mediana

88,9*

88,9

66,7*

Mínimo; Máximo

(33,3; 100,0)

(22,2; 100,0)

(11,1; 100,0)

Relacionamento Interpessoal

0,047

Média (desvio padrão)

85,2 (16,3)

87,6 (14,6)

80,7 (16,8)

Mediana

93,3

93,3*

80,0*

Mínimo; Máximo

(40,0; 100,0)

(60,0; 100,0)

(46,7; 100,0)

Organização do Serviço

0,033

Média (desvio padrão)

76,2 (14,5)

80,1 (14,7)

72,3 (17,9)

Mediana

71,4

85,7*

66,7*

Mínimo; Máximo

(47,6; 100,0)

(42,9; 100,0)

(33,3; 100,0)

Satisfação Geral

0,015

Média (desvio padrão)

79,6 (13,8)

81,4 (12,9)

74,0 (16,3)

Mediana

79,6

85,2*

70,4*

Mínimo; Máximo

(47,1; 100,0)

(53,7; 100,0)

(46,3; 98,2)

 

NOTA: Valor-P referente ao teste de Kruskal-Wallis. * Grupos com diferença significativa (P<0,05) pelo teste post-hoc de Dunn.

 

A classificação socioeconômica apresentou relação estatisticamente significativa com a satisfação das pacientes no domínio “Parto”. Conforme Tabela 4, observa-se que as pacientes pobres e extremamente pobres estavam mais insatisfeitas do que aquelas situadas nos estratos entre a baixa classe média e a classe alta. Para os demais domínios, não foram observadas diferenças de satisfação.

 

Tabela 4. Satisfação das pacientes segundo a classificação socioeconômica.

Domínio

Classificação Socioeconômica (Critério Brasil)

Valor-P

D-E

C2

C1

B-A

n=19

n=46

n=69

n=46

Parto

0,028

  Média (desvio padrão)

70,8 (19,4)

81,3 (16,5)

85,2 (18,2)

81,2 (21,5)

  Mediana

66,7*

83,3

88,9*

88,9*

  Mínimo; Máximo

(44,4; 100,0)

(33,3; 100,0)

(11,1; 100,0)

(22,2; 100,0)

 

NOTA: Valor-P referente ao teste de Kruskal-Wallis. * Grupos com diferença significativa (P<0,05) pelo teste post-hoc de Dunn.

 

Não foram identificadas diferenças estatisticamente significativas de satisfação no comparativo entre os tipos de parto realizado, fossem eles normais, cesarianos ou com utilização de fórceps. Também não se identificaram diferenças significativas de satisfação entre pacientes que desejavam parto do tipo normal ou cesariano. Ou seja, isoladamente, tanto o tipo de parto realizado como o tipo de parto desejado não afetaram a satisfação das pacientes. Entretanto, quando o tipo de parto realizado foi relacionado com o tipo de parto desejado, observou-se diferença significativa de satisfação, conforme Tabela 5.

 

Tabela 5. Satisfação das pacientes no comparativo entre o tipo de parto desejado e o efetivamente realizado.

Domínios Avaliados

Desejou e Realizou parto Normal

Desejou e Realizou parto Cesariano

Desejou parto Normal e realizou Cesariano

Desejou Cesariano e Realizou Normal

Valor P

n=98

n=23

n=33

n=8

Parto

0,043

  Média (desvio padrão)

83,0 (19,9)

86,2 (16,7)

75,3 (16,3)

75,0 (20,1)

  Mediana

88,9

100,0*

66,7*

75,0*

  Mínimo; Máximo

(11,1; 100,0)

(55,6; 100,0)

(44,4; 100,0)

(44,4; 100,0)

 

Relacionamento Interpessoal

0,025

  Média (desvio padrão)

85,8 (15,2)

89,6 (14,0)

79,6 (16,2)

75,8 (17,4)

  Mediana

93,3

100,0*

66,7*

66,7*

  Mínimo; Máximo

(53,3; 100,0)

(66,7; 100,0)

(60,0; 100,0)

(53,3; 100,0)

 

Total Geral

0,049

   Média (desvio padrão)

79,2 (13,7)

82,5 (13,9)

72,8 (16,6)

71,7 (14,9)

   Mediana

79,6

86,3*

66,7*

66,8*

   Mínimo; Máximo

(51,9; 100,0)

(57,4; 100,0)

(48,2; 100,0)

(55,6; 96,3)

 

Valor-P referente ao teste de Kruskal-Wallis. * Grupos com diferença significativa (P<0,05) pelo teste post-hoc de Dunn. Foram excluídas da comparação 5 mulheres que realizaram parto vaginal com utilização de fórceps e 14 mulheres que disseram não ter preferência em relação ao tipo de parto que viria a ser realizado.

 

Nos domínios “Parto” e “Relacionamento Interpessoal”, bem como no escore geral, pacientes que desejavam e realizaram parto cesariano estavam mais satisfeitas do que aquelas que desejavam cesariana e realizaram parto normal, ou que desejavam parto normal e realizaram cesariana. Semelhantemente, pacientes que desejavam e realizaram parto normal também apresentaram escores elevados de satisfação, sem, no entanto, diferença estatisticamente significativa na comparação com os demais grupos.

Quando a amostra é agrupada em duas categorias, de acordo com o atendimento ou não da expectativa da mulher sobre a via de parto, observa-se que os maiores graus de satisfação concentram-se no grupo cujos partos se deram pela via desejada pelas pacientes, fosse ela vaginal ou cesariana, conforme gráficos da Figura 1. Essa diferença é estatisticamente significativa para os domínios “Parto” (p=0,005), “Relacionamento Interpessoal” (p=0,007) e “Organização do Serviço” (p=0,011), bem como para o escore geral de satisfação (p=0,008).

 

Figura 1. Gráficos comparativos dos escores de satisfação de pacientes do Alojamento Conjunto entre tipo de parto desejado e realizado, excluindo fórceps e indiferentes.

 

Não apresentaram relação estatisticamente significativa com a satisfação as variáveis sobre presença de acompanhante durante o parto, número de gestações, idade, estado civil e escolaridade, cujos dados não são apresentados.

 

DISCUSSÃO

O presente estudo verificou que os maiores graus de satisfação foram obtidos pelo domínio “Relacionamento Interpessoal”, que aborda, principalmente, os cuidados e orientações ofertados por médicos e enfermeiros durante a internação da paciente no Alojamento Conjunto, portanto, após o parto. Nesse momento, mãe e bebê saudáveis permanecem juntos um ao outro; a amamentação é estimulada, a presença do acompanhante é frequente e o binômio recebe a visita de outros familiares. Em contrapartida, o domínio “Pronto Atendimento” obteve os piores escores de satisfação, principalmente na avaliação do tempo de espera e do atendimento na recepção do serviço. Pode-se supor que a diferença entre esses dois domínios esteja relacionada à ansiedade e a um possível desconforto físico da parturiente num momento anterior ao seu acolhimento no hospital, prejudicando sua satisfação. É oportuno mencionar que o evento do parto está frequentemente associado a um sentimento de ansiedade intensa22, 23. Além disso, a percepção e as expectativas das pacientes sobre o tempo de espera em serviços de emergência são muito mais importantes na determinação da satisfação do que o tempo efetivo de espera24. À medida, porém, que a gestante é acolhida pela equipe do hospital, tem seu parto realizado de forma humanizada e pode, enfim, permanecer junto de seu filho e amamentá-lo, observa-se um aumento da satisfação.

No domínio “Parto”, a questão sobre os procedimentos realizados para aliviar a dor obteve escore de satisfação inferior àquelas quanto à presença de acompanhantes e à ajuda de profissionais. A literatura tem observado que a relação entre satisfação, dor de parto e analgesia é complexa. Embora o fenômeno da dor possa influenciar a satisfação das pacientes, essa relação não é óbvia, direta, ou sequer tão forte quanto a influência que os profissionais da saúde podem exercer por meio de suas atitudes5. De qualquer modo, é salutar a realização de novos estudos que permitam ampliar o conhecimento sobre a relação entre dor no parto e satisfação, sobretudo explorando a influência de métodos farmacológicos e não farmacológicos para o controle da dor.

Outros aspectos que apresentaram maior insatisfação estavam relacionados, principalmente, ao ambiente físico e à organização do Alojamento Conjunto. A presença de barulhos, por exemplo, obteve uma das piores avaliações de todo o questionário, provavelmente em virtude de a unidade, na época deste estudo, possuir quartos grandes (contendo de três a oito leitos), com internação tanto da mãe como do recém-nascido e recebendo, ainda, a visita controlada de familiares, além da circulação de médicos, enfermeiros e demais profissionais responsáveis pelo cuidado das pacientes. O que a literatura tem demonstrado é que pacientes internadas em quartos individuais detém maior satisfação do que aquelas admitidas em quartos coletivos25. Essa diferença afeta não apenas os aspectos físicos do ambiente, mas também o cuidado da enfermagem, as orientações recebidas sobre o cuidado com o bebê, a amamentação e o plano de alta.

Um dos fatores identificados como determinantes da satisfação foi o tempo de internação, com tendência de diminuição da satisfação à medida que as pacientes permaneciam internadas por mais dias. Esse resultado é condizente com um estudo que comparou a satisfação de dois grupos de pacientes que haviam realizado cesárea de emergência. O primeiro deles, com maior satisfação, incluiu pacientes com baixa permanência (3,6 dias), enquanto o segundo, mais insatisfeito, incluiu pacientes com permanência normal (4,8 dias)26. Outra pesquisa concluiu que 97% das pacientes recomendariam a suas amigas um programa de internação pós-parto de curta duração, 93% participariam dele novamente e 93% consideraram seu tempo de internação adequado27. Entretanto, não são apresentados dados sobre a satisfação das pacientes, verificando se haveria diferenças de satisfação à medida que o tempo de internação avançasse27.

Um dos desafios associados à redução do tempo de internação de pacientes em pós-parto é a implementação de um programa efetivo de cuidado domiciliar (ou de outro modelo de fácil acesso à puérpera), viabilizando a promoção de qualquer intervenção que, de outro modo, seria ofertada no interior da maternidade4. A pesquisa da fenilcetonúria, por exemplo, popularmente conhecida como “teste do pezinho”, tem como objetivo detectar e tratar precocemente doenças que, se prevenidas, evitam sequelas como a deficiência mental28. Entretanto, dado que as concentrações de fenilalanina podem não estar significativamente elevadas até que o lactente tenha ingerido proteína dietética durante as primeiras 48 horas de vida, a realização desse teste não deve ocorrer precocemente29. Segue-se que algumas mães podem permanecer internadas por mais tempo do que julgam ser necessário, tendo em vista a disponibilidade de horários nos quais o teste da fenilalanina pode ser realizado no hospital.

O nível socioeconômico foi outro fator a relacionar-se com a satisfação das pacientes, com menores graus de satisfação no domínio “Parto” para as pacientes pobres e extremamente pobres, no comparativo com aquelas situadas nos estratos mais favorecidos. Esse resultado é condizente com a revisão de literatura de Sitzia e Wood, segundo a qual, pacientes mais pobres detêm menor satisfação30. Esse dado, porém, é considerado pouco consistente pelos autores, dada a dificuldade de se mensurar as variáveis socioeconômicas. De qualquer modo, outra revisão internacional também verificou que as pacientes mais favorecidas recebem melhor tratamento dos médicos, ainda que se considere o mesmo serviço de saúde31. No cenário brasileiro, estudo de coorte de base hospitalar com 15.688 mulheres concluiu que as maiores chances de satisfação geral para com a atenção ao parto estavam associadas a mulheres pertencentes às classes A e B, enquanto aquelas de cor da pele preta ou parda tinham a menor chance de estarem satisfeitas32. De acordo com os autores, existiria em alguns serviços públicos do país uma cultura discriminatória, marcada pela concepção de que as mulheres de baixa renda e de pouca escolaridade não teriam capacidade de entendimento para decidir sobre as intervenções no parto. Segue-se, de acordo com o referido estudo, que essas mulheres relatam menor clareza nas explicações, pouca abertura a eventuais perguntas e reduzida participação nas decisões.

No que diz respeito à relação entre o tipo de parto realizado e a satisfação das parturientes, não foram identificadas diferenças estatisticamente significativas de satisfação entre as cesarianas e os partos vaginais, resultado semelhante ao de outro estudo nacional publicado recentemente33. Por outro lado, se observaram diferenças estatisticamente significativas de satisfação na relação entre o tipo de parto realizado e desejado, sendo que os menores graus de satisfação foram identificados entre as pacientes com expectativas frustradas em relação à via efetiva do parto. Com efeito, a literatura tem referido que a satisfação materna é influenciada pela expectativa das mulheres, nem sempre retratando a qualidade real do atendimento32. Entretanto, muitos trabalhos não apresentam uma distinção clara entre os conceitos de expectativa e preferência em relação ao parto: enquanto o primeiro está usualmente baseado no conhecimento do que é possível, o segundo concerne ao desejo da mulher5. Nesse sentido, cumpre ressaltar que o grupo mais insatisfeito do presente estudo, no comparativo entre tipos de parto desejado e realizado, era composto de oito mulheres que desejavam realizar cesariana, mas evoluíram para parto vaginal. Portanto, embora não possuíssem indicação médica para a realização da cirurgia cesariana, elas desejavam fazê-lo e sentiram-se insatisfeitas com a frustração dessa expectativa.

A preferência da mulher por determinada via de parto é um dos elementos mais frequentemente apontados como responsáveis pela alta prevalência de cesarianas13. Estudo nacional recente verificou que 39,3% das mulheres nulíparas e 29,5% das primíparas tinham preferência pela cesariana33. No presente estudo, 33 mulheres manifestaram o desejo por esse tipo de parto, o que corresponde a 18,2% da amostra. Ainda que pese a escolha da mulher, cumpre frisar que a cesariana é uma alternativa médica idealmente utilizada em situações em que as condições materno-fetais não favorecem o parto vaginal34. Além disso, embora se deva reconhecer a segurança da cesárea moderna e as contribuições dessa intervenção para uma melhor assistência à saúde, é importante que sua indicação seja criteriosa, pois não se trata de um procedimento inócuo e sua realização pode trazer riscos adicionais para a mãe e a criança34.

Portanto, conforme recomendou um estudo brasileiro, cabe aos profissionais que atuam na assistência pré-natal avaliar as razões implícitas na demanda da mulher pela cesariana, discutindo os riscos e benefícios dessa cirurgia em relação ao parto vaginal13. Além de proporcionar maior segurança à saúde dos envolvidos, essa estratégia tende a resultar em maior satisfação da paciente, pois, de acordo com a literatura, decisões referentes a procedimentos médicos e a medicações tendem a ser mais bem aceitas pela mulher e seu acompanhante quando eles compreendem as razões implícitas nessas decisões4.

A discussão dessa temática, porém, não deve se restringir ao contexto hospitalar de atenção ao parto ou de acompanhamento da gravidez. Os benefícios do parto normal em comparação à cesariana, bem como os riscos frequentemente ignorados na preferência por este procedimento cirúrgico, necessitam ser divulgados amplamente na sociedade brasileira, em caráter educativo e em benefício da saúde pública, de modo a modificar a chamada “cultura da cesariana”. A abordagem desse tema em escolas, universidades e centros comunitários, por exemplo, certamente contribuiria para a desmistificação de uma série de temores relacionados ao parto vaginal. Além disso, é crucial que esse tema seja tratado de forma responsável em filmes, novelas e séries de televisão, promovendo uma cultura que privilegie a escolha daquela - parto normal - que é reconhecidamente a melhor via de parto para conclusão da gestação, em detrimento daquela - cesariana -  que se propagandeia, direta ou indiretamente, como a mais cômoda, fácil ou adequada a determinadas classes sociais.

Com relação às limitações do presente estudo, cabe mencionar que foram incluídas apenas mulheres em pós-parto internadas em sistema de alojamento conjunto, portanto, que pudessem amamentar e cujos recém-nascidos não necessitassem de terapia intensiva ou semi-intensiva neonatal. É salutar que, futuramente, seja promovida a avaliação da satisfação baseada em amostras mais heterogêneas do ponto de vista da saúde da mulher e do recém-nascido, a fim de corroborar os resultados identificados no presente estudo.

Também é necessário considerar um possível efeito do viés de gratidão. Problema recorrente na avaliação da satisfação em serviços públicos de saúde, esse viés caracteriza-se pela omissão de questionamentos e críticas negativas dos usuários, que temem ter o acesso à assistência prejudicado como resultado da participação no estudo35. Essa dificuldade tende a ser ainda maior no caso da assistência perinatal, pois as puérperas podem se sentir aliviadas, agradecidas e com sentimentos positivos depois do nascimento de uma criança saudável, “compensando qualquer experiência negativa da assistência”6. Para reduzir a influência desse viés, no presente estudo não foram coletados quaisquer dados que permitissem a identificação da paciente (como nome, número de matrícula ou de quaisquer outros documentos pessoais), de modo a assegurar o sigilo quanto às opiniões emitidas.

 

CONCLUSÕES

Os resultados do presente estudo permitem concluir que a satisfação das puérperas quanto ao atendimento no Pronto Atendimento tende a ser inferior em relação aos demais setores em que ocorre o acolhimento à mulher que busca assistência hospitalar para o parto, como o Alojamento Conjunto e o Centro Obstétrico, por exemplo. Em contrapartida, os maiores graus de satisfação se observam na relação estabelecida com os profissionais da saúde na internação posterior ao parto, quando mãe e recém-nascidos encontram-se juntos em sistema de alojamento conjunto, sendo possível a amamentação e o recebimento de visitas.

Com relação aos determinantes da satisfação, pode-se concluir que o tempo de internação, o nível socioeconômico das pacientes e a relação entre tipo de parto desejado e realizado desempenham papéis importantes, influenciando a satisfação para com diferentes aspectos da atenção ao parto e da internação pós-parto. O tempo de internação está inversamente relacionado com a satisfação sobre todos os aspectos da assistência: pacientes internadas há mais tempo apresentam menores graus de satisfação quanto ao Pronto Atendimento, ao parto, à relação com a equipe de saúde e com a organização do serviço. Já o nível socioeconômico das puérperas influencia a satisfação quanto ao parto, de tal modo que pacientes pobres e extremamente pobres detêm menor satisfação do que aquelas oriundas da média classe média e da classe alta.

Finalmente, o presente estudo permite concluir que as diferenças de satisfação em relação à via de parto são estatisticamente significativas apenas quando se inclui na análise o desejo prévio da paciente quanto a essa via. O que se observa é que as pacientes com expectativas frustradas detém menor satisfação especificamente quanto ao parto e à relação com os profissionais que a assistem. Nessa comparação, o grupo mais insatisfeito é o de mulheres com desejo de realizar cesariana, mas com indicação e realização efetiva de parto vaginal. Por outro lado, as pacientes que desejavam e realizaram parto vaginal (as quais representavam o maior grupo nesse comparativo) apresentaram altos níveis de satisfação, semelhantes aos das pacientes que queriam e realizaram cesarianas.

 

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Recebido: 15/12/2016; Aceito e publicado: 17/01/2017

Correspondência: Profª Drª Angela Maria Bacha. Endereço: Caism – Rua Alexander Fleming, 101 – Cidade Universitária Zeferino Vaz – Distrito de Barão Geraldo – CEP 13083-881. Email: angela.bacha@reitoria.unicamp.br Telefone: 19-3521-2940.

Local do estudo: Hospital da Mulher Prof. Dr. José Aristodemo Pinotti – Caism/Unicamp, Campinas (SP), Brasil.

Financiamento: os custos inerentes à realização do presente estudo foram cobertos pelo Hospital da Mulher Prof. Dr. José Aristodemo Pinotti – Caism e pelo programa de Bolsa Auxílio Social do Serviço de Apoio do Estudante da Unicamp.

Conflito de Interesses: os autores não declararam conflito de interesses

 

 

 

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