Rev. Adm. Saúde (On-line), São Paulo, v. 24, n. 95: e380, abr. – jun. 2024, Epub 26 jun. 2024

http://dx.doi.org/10.23973/ras.95.380

 

 

ARTIGO DE REVISÃO

 

Estratégias para a promoção da segurança do paciente em unidades de terapia intensiva pediátrica: revisão integrativa

Strategies for promoting patient safety in pediatric intensive care units: integrative review

 

Paola de Camargo Bendinelli1, Rosemeire Keiko Hangai2

 

 

1. Enfermeira. Serviço de Emergência do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP). São Paulo SP

2. Enfermeira. Coordenadora do Programa de Residência Multiprofissional em Gestão Integrada de Serviços de Saúde do HCFMUSP. São Paulo SP

 

 

 

RESUMO

Introdução: Crianças hospitalizadas são vulneráveis à ocorrência de eventos adversos, e erros graves ocorrem com maior frequência em ambientes de cuidados intensivos. Quando comparado a outros setores críticos de cuidados pediátricos, a unidade de terapia intensiva conta com o maior número de erros de medicação. Objetivo: Identificar as publicações dos últimos 5 anos sobre as estratégias para a promoção da segurança do paciente em unidades de terapia intensiva pediátrica. Métodos: Revisão integrativa de literatura. 659 artigos foram identificados, e 21 selecionados para compor a revisão. Resultados: Os resultados foram classificados em 3 categorias: comunicação efetiva, implementação de protocolos e cultura de segurança. Conclusão: Para a promoção da segurança do paciente em unidades de terapia intensiva pediátrica, é necessário o planejamento, aprimoramento e incorporação de estratégias voltadas para uma comunicação efetiva, padronização de procedimentos, checklists, protocolos e bundles, e uma cultura de segurança institucional e organizacional com múltiplas estratégias integrando líderes, gestores e equipes, além do envolvimento da família durante a internação.

Palavras-chave: Qualidade da Assistência à Saúde. Segurança do Paciente. Unidade de Terapia Intensiva. Pediatria.

 

ABSTRACT

Introduction: Hospitalized children are vulnerable to the occurrence of adverse events, and serious errors occur more frequently in intensive care environments. When compared to other critical sectors of pediatric care, the intensive care unit has the highest number of medication errors. Objective: to identify publications from the last 5 years on strategies for promoting patient safety in pediatric intensive care units. Methods: Integrative literature review. 659 articles were identified, and 21 selected to compose the review. Results: The results were classified into 3 categories: effective communication, implementation of protocols and safety culture. Conclusion: To promote patient safety in pediatric intensive care units, it is necessary to plan, improve and incorporate strategies aimed at effective communication, standardization of procedures, checklists, protocols and bundles, and an institutional and organizational safety culture with several strategies integrating leaders, managers and teams, in addition to family involvement during internationalization.

Keywords: Quality of Health Care. Patient Safety. Intensive Care Unit. Pediatrics.

 

 

 

INTRODUÇÃO

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a segurança do paciente pode ser definida como a redução, a um mínimo aceitável, do risco de dano desnecessário associado ao cuidado de saúde.1 O relatório To Err is Human, divulgado em 2000 pelo Institute of Medicine (IOT), trouxe relevância ao tema ao apontar que cerca de 100 mil pessoas morreram em hospitais a cada ano vítimas de eventos adversos nos Estados Unidos da América (EUA), além de trazer um grave prejuízo financeiro e prolongamento do tempo de internação.2

No Brasil, a portaria nº 529 de 2013 instituiu o Programa Nacional de Segurança do Paciente (PNSP), com o objetivo de propor e validar protocolos, guias e manuais voltados à segurança do paciente. O PNSP abrange conceitos importantes para a melhoria dos serviços na prática, que envolvem a identificação, a notificação e a resolução dos problemas, e a instauração da cultura do aprendizado organizacional a partir da ocorrência de incidentes.3

Crianças hospitalizadas são vulneráveis à ocorrência de eventos adversos-4, e erros graves ocorrem com maior frequência em ambientes de cuidados intensivos.5 Os principais pontos de atenção relacionadas à segurança destes pacientes envolvem as características físicas e de desenvolvimento, como as variações de peso e altura, o estado jurídico de dependência legal de um cuidador, a ausência de instituições de saúde dedicadas exclusivamente às crianças, a escassez de protocolos voltados para a pediatria e medicamentos off label não testados nessa população.6

Erros de medicação são as principais causas de eventos adversos em crianças7, e quando comparado a outros setores críticos de cuidados pediátricos, a unidade de terapia intensiva conta com o maior número de erros de medicação8. Um estudo americano realizado em 6 hospitais pediátricos avaliou 600 prontuários e identificou 240 eventos adversos, correspondendo a uma taxa de 40 eventos a cada 100 pacientes internados, e desse total, 108 (45%) foram classificados como potencialmente evitáveis.9

O objetivo do estudo foi identificar as publicações dos últimos 5 anos sobre as estratégias para a promoção da segurança do paciente em unidades de terapia intensiva pediátrica.

 

MÉTODOS

Estudo de revisão integrativa, com a seguinte questão norteadora: “Quais são as estratégias para a promoção da segurança do paciente em unidades de terapia intensiva pediátrica?”. Utilizou-se a estratégia PICO (População = unidades de terapia intensiva pediátrica; Intervenção = estratégias, Comparação = não se aplica; Desfecho = promoção da segurança do paciente) para a formulação da pergunta.

A busca foi realizada nas bases Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (Lilacs), Medline via Pubmed e Scientific Electronic Library Online (SciELO), com os seguintes descritores controlados: “Patient Safety” AND “Pediatric intensive care unit”.

Foram incluídos artigos publicados no período de 2018 a 2023, nos idiomas inglês, português e espanhol, realizados em unidades de terapia intensiva pediátrica, que apresentassem a implementação de ações e/ou avaliação da segurança do paciente, e que respondessem à questão norteadora. Foram excluídos teses e dissertações, editoriais, revisões de literatura, capítulos de livros, artigos que não estivessem disponíveis para leitura, que não abordavam a segurança do paciente ou que não respondiam à questão norteadora.

As buscas ocorreram em agosto de 2023. A ferramenta metodológica Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses (PRISMA) foi utilizada para suporte na busca pelos artigos. Após a leitura do título e resumos tendo como referência a questão norteadora, os critérios de seleção dos artigos e leitura na íntegra, 21 trabalhos foram selecionados para compor a revisão integrativa, sendo 15 no Medline via PubMed, 3 na SciELO e 3 na LILACS. (Figura 1.)

 

Diagrama

Descrição gerada automaticamente

Figura 1. Fluxograma da identificação, triagem, elegibilidade e inclusão das publicações conforme a ferramenta PRISMA.

 

RESULTADOS

O Quadro 1 sintetiza os resultados dos artigos que integraram a revisão, suas respectivas referências e categorias elencadas (comunicação efetiva, implementação de protocolos e cultura de segurança).

 

Quadro 1. Quadro sinóptico com os estudos incluídos na revisão.

Referência

Síntese dos resultados

Categorias

Vória JO, Padula BLD, Abreu MNS, Correa AR, Rocha PK Manzo BF. Adesão às barreiras de segurança no processo de administração de medicamentos na pediatria. Texto Contexto Enferm. 2020;29:e20180358.

Quanto ao preparo de medicações endovenosas, as ações de higienização do local do preparo, desinfecção da ampola e conexão, conferência do medicamento, dose e via com a prescrição e checagem dupla dos medicamentos são as etapas com menor adesão pela equipe de enfermagem. A capacitação e a educação continuada da equipe de enfermagem são indispensáveis para a adesão de boas práticas.

Cultura de segurança

Julca CSM, Rocha PK, Tomazoni A, Manzo BF, de Souza S, Anders JC. Utilização de barreiras de segurança no preparo de drogas vasoativas e sedativos/analgésicos em terapia intensiva pediátrica. Cogitare Enfermagem. 2018;23(4)

A utilização de barreiras de segurança durante o preparo de drogas vasoativas, sedativos e analgésicos, como evitar a utilização de prescrições verbais, utilizar rótulos específicos para transcrição de medicamentos que abordem as informações essenciais do paciente e do medicamento, utilizar a dupla checagem e evitar a interrupção dos profissionais durante o preparo de drogas, podem reduzir significativamente a ocorrência de erros.

Implementação de protocolos e cultura de segurança

Bernal SCZ, Raimondi DC, de Oliveira JLC, Inoe KC, Matsuda LM. Práticas de identificação do paciente em unidade de terapia intensiva pediátrica. Cogitare Enfermagem. 2018;23(3).

O uso da pulseira de identificação do paciente com dados completos (nome da criança, nome do responsável, data de internação, data de nascimento, número do leito, e idade da criança), e não somente placas identificadoras na cabeceira do leito e porta do box, é uma barreira essencial para mitigar erros e prestar um cuidado seguro.

Cultura de segurança

Perkowski C, Eldridge B, Zurca AD, Demartini TKM, Ceneviva GD, Williams D, et al. Impact of Pediatric Intensive Care Unit Preadmission Huddle on Perceptions of Interprofessional Communication About Patient Safety. Crit Care Nurse. 2022;42(4):55-67.

A implementação do huddle no momento de pré-admissão melhora a qualidade da comunicação interprofissional entre os membros da equipe, e pode gerar melhores desfechos clínicos.

Comunicação efetiva

Aldawood F, Kazzaz Y, AlShehri A, Alali H, Al-Surimi K. Enhancing teamwork communication and patient safety responsiveness in a pediatric intensive care unit using the daily safety huddle tool. BMJ Open Qual. 2020;9(1):e000753.

O uso de huddles diários promove um ambiente equitativo, onde a equipe pode falar livremente e identificar e resolver precocemente questões relacionadas à segurança do paciente. O ambiente se torna aberto e com discussões ativas juntamente à liderança da unidade, além de promover discussões com o objetivo de tomada de decisão sobre a ação certa no momento certo da internação.

Comunicação efetiva

Schiessler MM, Darwin LM, Phipps AR, Hegemann LR, Heybrock BS, Macfadyen AJ. Don't Have a Doubt, Get the Catheter Out: A Nurse-Driven CAUTI Prevention Protocol. Pediatr Qual Saf. 2019;4(4):e183.

A implementação de um protocolo de retirada de cateter vesical de demora, contendo indicações clínicas para o uso e recomendações para a remoção quando não houver mais necessidade, diminui em 28% os dias de uso do dispositivo em 6 meses após a intervenção, além de queda na taxa de infecções urinárias associadas ao uso de cateter (4.8 para 0.8) após 1 ano.

Implementação de protocolos

Dos Santos Alves DF, Moraes ÉS, Conti PBM, Bueno GCV, de Souza TH, Pereira EOP, Brandão MB, Peterlini MAS, Pedreira MLG. A Pediatric Intensive Care Checklist for Interprofessional Rounds: The R-PICniC Study. Am J Crit Care. 2022;31(5):383-389.

O uso de checklists para uso em rounds interprofissionais pode melhorar a qualidade dos cuidados, além de funcionar como um guia.

Comunicação efetiva

Kalroozi F, Joolaee S, Ashghali Farahani M, Haghighi Aski B, Manafi Anari A. Assessing Safety Status of Pediatric Intensive Care Units of Tehran, Iran according to the World Health Organization's Safety Standards. J Caring Sci. 2022;11(2):76-82.

É essencial o treinamento dos enfermeiros para aprimorar seus conhecimentos e habilidades sobre a importância das medidas de segurança do paciente preconizadas pela Organização Mundial da Saúde, como higienização das mãos, administração segura de medicamentos, identificação do paciente, comunicação efetiva e cirurgia segura. Gestores, líderes de saúde e pesquisadores devem desenvolver e validar ferramentas para avaliar o desempenho da equipe de saúde e realizar uma supervisão mais eficaz, além de desenvolver medidas para manter os funcionários motivados a fornecer um atendimento de qualidade.

Cultura de segurança

Ulmer FF, Lutz AM, Müller F, Riva T, Bütikofer L, Greif R. Communication Patterns During Routine Patient Care in a Pediatric Intensive Care Unit: The Behavioral Impact of In Situ Simulation. J Patient Saf. 2022;18(2):e573-e579.

A realização de treinamento de simulação entre as equipes em situações críticas e agudas, com o foco na comunicação em circuito fechado, eleva potencialmente a qualidade do atendimento, traduzindo estas habilidades para o cenário prático.

Comunicação efetiva

Gupta N, Sones A, Powell M, Robbins J, Wilson S, Hill A, et al. Quality Improvement Methodology to Optimize Safe Early Mobility in a Pediatric Intensive Care Unit. Pediatr Qual Saf. 2020;6(1):e369.

O uso de um checklist de mobilização precoce promove maior segurança para a equipe, sendo uma ferramenta importante para a padronização do processo e prevenção de eventos adversos e complicações ao paciente.

Implementação de protocolos

Barreto HAG, Sestren B, Boergen-Lacerda R, Soares LCDC. Standard concentration infusions of inotropic and vasoactive drugs in paediatric intensive care: a strategy for patient safety. J Pharm Pharmacol. 2019;71(5):826-838.

Um protocolo visando a padronização da concentração de drogas vasoativas, inotrópicas e de alta vigilância, ao em vez da tradicional prescrição individualizada baseada no peso, é mais seguro e reduz riscos de eventos adversos aos pacientes, reduzindo cálculos e sistematizando o uso desses medicamentos. De acordo com a análise farmacoeconômica, o padrão de solução não aumenta os custos das soluções comumente administradas, e podem ser vinculados à redução de custos considerando a redução da ocorrência de eventos adversos.

Implementação de protocolos

Kashyap R, Murthy S, Arteaga GM, Dong Y, Cooper L, Kovacevic T, et al. Effectiveness of a Daily Rounding Checklist on Processes of Care and Outcomes in Diverse Pediatric Intensive Care Units Across the World. J Trop Pediatr. 2021;67(3):fmaa058.

O uso de um checklist estruturado para o round diário diminui o tempo de permanência na UTI (de 9,4 para 7,3 dias), o tempo de internação (15,4 para 12,6 dias), dias em uso de ventilação mecânica (42,6% para 33,8%), cateter venoso central (31,3% para 25,3%), e cateter vesical de demora (30,6% para 24,4%) em 6 meses após a implementação, além de aumentar a adesão da equipe a protocolos institucionais.

Comunicação efetiva

Spazzapan M, Vijayakumar B, Stewart CE. A bit about me: Bedside boards to create a culture of patient-centered care in pediatric intensive care units (PICUs). J Healthc Risk Manag. 2020 Feb;39(3):11-19.

Quadros de cabeceira contendo informações não médicas sobre o paciente, como fotos, brinquedo, cor e música favoritas, como o paciente gosta de ser chamado e pessoas importantes para ele, contribuem para o cuidado centrado no paciente, e ampliam a compreensão dos profissionais de saúde sobre as necessidades específicas de cada indivíduo, individualizando o tratamento. A estratégia fornece dados que proporcionam maior envolvimento e comunicação no cuidado entre acompanhantes e colaboradores.

Cultura de segurança

Charyk Stewart T, Luong K, Alharfi I, McKelvie B, Fraser DD. Identification of adverse events in pediatric severe traumatic brain injury patients to target evidence-based prevention for increased performance improvement and patient safety. Injury. 2020;51(7):1568-1575.

A fusão de bancos de dados, combinando informações sobre detalhes do evento adverso, tipo e gravidade do dano, juntamente com dados demográficos dos pacientes, lesões, custos e desfechos, identifica riscos à segurança do paciente, sendo possível verificar oportunidades de otimização de protocolos de cuidado e tratamento.

Implementação de protocolos

Barzegar R, Martin B, Fleming G, Jatana V, Popat H. Implementation of the 'PicNic' handover huddle: A quality improvement project to improve the transition of infants between pediatric and neonatal intensive care units. J Paediatr Child Health. 2022;58(11):2016-2022.

A inserção de uma ferramenta de handover para a passagem de plantão de pacientes entre unidades, estruturada pela metodologia SBAR (situação, breve histórico, avaliação e recomendação) promove uma transição de cuidados padronizada.

Comunicação efetiva

Arpí L, Negrette C, Videla Dorna S, Cernadas C, Fierro Vidal Á, García M, et al. Improvement in communication during patient handoff between areas from a children's hospital. Arch Argent Pediatr. 2021;119(4):259-265.

A utilização de um handoff padronizado aumenta em 88% a comunicação de dados clínicos relacionados ao paciente, como a terapia e o diagnóstico, além de proporcionar melhoria na transferência de dados relevantes e uma continuidade do cuidado segura.

Comunicação efetiva

Erdfelder F, Ebach F, Zoller R, Walterscheid V, Weiss C, Kappler J, et al. Implementation of 2D Barcode Medication Labels and Smart Pumps in Pediatric Acute Care: Lessons Learned. Appl Clin Inform. 2023;14(3):503-512.

O uso de bombas de infusão inteligentes e de um sistema de medicamentos com códigos de barra no rótulo podem contribuir para a segurança do paciente e prevenir erros de prescrição, por conta de um sistema de banco de dados de medicações com padrões pré-configurados e avisos, como a concentração, diluente de base quando aplicável e via de administração.

Implementação de protocolos

Sutherland A, Ashcroft DM, Phipps DL. Exploring the human factors of prescribing errors in pediatric intensive care units. Arch Dis Child. 2019;104(6):588-595.

A sobrecarga cognitiva é o principal fator que contribui para a ocorrência de erros de prescrição, sendo manifestada na prática por erros de omissão e de escolha do medicamento. As intervenções para estes fatores devem ser nas mudanças culturais e comportamentais, com ênfase na realização de treinamentos, além de medidas de conscientização para evitar interrupções e distrações.

Implementação de protocolos e cultura de segurança

Moreira BC, Rigo FL, Leite EI. A compreensão dos profissionais de uma unidade de terapia intensiva pediátrica acerca do Bundle de cateter venoso central. Enferm Foco. 2023;14:e-202324.

O uso de bundle de inserção e manutenção de cateter venoso central é um importante instrumento na redução das taxas de infecção, e a educação permanente com toda a equipe de saúde é essencial para a adesão às boas práticas, pois essa estratégia qualifica os profissionais através de mudanças no comportamento, e se torna indispensável para a qualidade na assistência em saúde.

Implementação de protocolos

Tavares LT, Silva GSS, Macêdo LLS, Guimarães MAP, Albergaria TFS, Pinto Junior EP. Avaliação da cultura de segurança do paciente em unidade de terapia intensiva pediátrica em hospital público. Rev. Pesqui. (Univ. Fed. Estado Rio J., Online). 2021;13: 974-981.

Para alcançar uma melhor cultura de segurança do paciente, é necessário estimular a comunicação sobre os erros, registro de eventos adversos e respostas não punitivas.

Cultura de segurança

Costa ACL, Silva DCZ, Correa AR, Marcatto JO, Rocha PK, Matozinhos FP et al. Percepção da enfermagem quanto aos desafios e estratégias no contexto da segurança do paciente pediátrico. Reme: Rev. Min. Enferm. 2020;24:e1345.

A comunicação efetiva por meio da metodologia SBAR é uma estratégia importante para o aprimoramento da segurança do paciente. A demanda por educação continuada, o envolvimento dos gestores, engajamento na promoção de uma cultura de segurança e a identificação de possibilidades de envolvimento da família no cuidado são estratégias importantes para o aprimoramento da segurança do paciente.

Comunicação efetiva, Implementação de protocolos e Cultura de segurança

 

 

DISCUSSÃO

Na literatura, são escassas as revisões que compilam as ações necessárias para a promoção da segurança do paciente em unidades de terapia intensiva pediátrica, levando as autoras a explorarem as pesquisas científicas sobre o tema. Ao identificar essas estratégias, os profissionais envolvidos, tanto com a assistência quanto com a gestão, poderão implementar intervenções eficazes para a prevenção de potenciais eventos. Neste setor e população, isso resulta em boas práticas e eleva a qualidade do serviço.

 

Comunicação efetiva

Um estudo realizado em um setor de emergência pediátrica evidenciou uma diminuição significativa no número de erros após a realização de treinamentos com simulações de comunicação em circuito fechado.10

Um estudo realizado nos Estados Unidos implementou um huddle interdisciplinar diário de segurança em unidades críticas e não críticas de um hospital, e trouxe como resultados a diminuição das taxas de tempo de utilização de dispositivos e infecções relacionadas aos cuidados de saúde, além da promoção de uma cultura de segurança na equipe.11

A implementação de rounds com o uso de checklist contribui para a melhoria do cuidado multidisciplinar ao paciente crítico, por estabelecer vínculo entre o serviço, a equipe de saúde e o usuário, e assim como na população pediátrica, promove uma redução significativa do tempo de internação, de pneumonia associada a ventilação, de infecção de trato urinário, dos dias de uso de ventilação mecânica e de sonda vesical de demora, segundo um estudo realizado em uma unidade de terapia intensiva adulto de um hospital filantrópico de médio porte da região sul do Brasil.12

Outro estudo avaliou o uso da abordagem estruturada SBAR no handover de transferência de pacientes para a sala de recuperação anestésica, e verificou redução de interrupções, além de melhorias na qualidade da passagem de informações, juntamente com mudanças organizacionais.13

Uma ferramenta de handoff padronizada melhora a comunicação durante as transferências, aumentando a menção de detalhes pertinentes e reduzindo eventos de distração, de acordo com um estudo realizado em uma unidade de terapia intensiva adulto nos Estados Unidos.14

 

Implementação de protocolos

Conforme um estudo realizado em 3 hospitais na Austrália, para melhorias na segurança do paciente no sistema de saúde, é necessário o desenvolvimento de protocolos de alta qualidade, metodologicamente e cientificamente validados.15

De acordo com um estudo brasileiro, os sistemas de notificação de incidentes são necessários para aprendizagem e monitoramento e detectam eventos precocemente, porém é necessário o aprimoramento da inserção e importação destes dados, além da geração de relatório de forma automática e análise dos registros para viabilizar a implementação de uma prática segura.16

Um estudo realizado em uma unidade de terapia intensiva neonatal concluiu que as bombas de infusão inteligentes têm a capacidade de melhorar a segurança do uso de medicações, devido uma alta conformidade no software na redução de erros de dose, além do acionamento de alertas que atuam na interceptação de erros.17

 

Cultura de segurança

Um estudo realizado em 2 hospitais da Dinamarca implementou treinamentos com simulações de habilidades técnicas (parada cardiorrespiratória, intubação, triagem, anafilaxia, hemorragia, insuficiência respiratória, via aérea difícil, transporte, trauma e escalas de deterioração clínica) e não técnicas (SBAR, comunicação em alça fechada, liderança, reavaliação e gestão de recursos), e observou impacto positivo na percepção dos profissionais sobre a cultura de segurança do paciente, particularmente em unidades críticas.18

Outro estudo realizado na Suíça verificou que treinamentos contribuem para o desenvolvimento interprofissional das equipes em relação às competências relacionadas à segurança do paciente, porém por tempo limitado, devendo ser repetidos e combinados com outras formas de apoio para garantir efeitos duradouros, como discussões de caso.19

Um estudo realizado em um hospital universitário no Japão relatou um aumento da conscientização sobre a segurança do paciente e da qualidade do cuidado após um programa de preparo para acreditação das metas estipuladas pela Joint Commission International (identificação correta, comunicação efetiva, segurança no uso de medicamentos, cirurgia segura, prevenção de infecções relacionadas à assistência e prevenção de quedas).20

Em um estudo realizado com enfermeiros no norte da Nigéria, foi possível identificar como motivos de baixa adesão às boas práticas relacionadas ao uso de medicamentos a alta carga de trabalho, baixa proporção de pacientes e enfermeiros, falta de supervisão dos superiores, falta de coordenação adequada entre médicos e enfermeiros e ausência de políticas efetivas.21

O uso da pulseira de identificação é considerado uma das estratégias mais importantes para garantir a identificação do paciente, porém na prática é utilizado com maior frequência quando são realizados procedimentos específicos, e nota-se ainda que os pacientes não são suficientemente informados sobre o uso e finalidades da pulseira de identificação, segundo um estudo observacional.22

Segundo um estudo baseado nos dados do gerenciamento de risco de um complexo hospitalar, as notificações espontâneas evidenciam a proporção dos incidentes em saúde,23 porém o processo de notificação possui obstáculos, sendo necessário elaborar estratégias com foco na prática educacional, com o objetivo de disseminar informações sobre o processo de notificação, além da promoção de uma cultura sem culpabilidade e com responsabilização, conforme um estudo realizado em um hospital público cardiovascular de alta complexidade do sul do Brasil.24

A avaliação das dimensões da cultura de segurança fornece um diagnóstico situacional local, e subsidia estratégias gerenciais visando o aprimoramento da qualidade da assistência prestada ao paciente, e essa mudança deve partir do envolvimento da gestão, na revisão e melhoria dos processos de trabalho, repercutindo diretamente no comportamento e desempenho dos profissionais, de acordo com um estudo transversal com 2.634 trabalhadores do serviço hospitalar de 7 instituições do Rio Grande do Sul, no Brasil.25

 

CONCLUSÃO

Para a promoção da segurança do paciente em unidades de terapia intensiva pediátrica, é necessário o planejamento, aprimoramento e incorporação de estratégias voltadas para uma comunicação efetiva, envolvendo a instauração de ferramentas para apoio em rounds e huddles interdisciplinares, handover e handoff, além de simulação de comunicação em alça fechada, essencial para a dinâmica de atendimentos críticos. A padronização de procedimentos, checklists, protocolos e bundles eleva a qualidade do serviço assistencial, otimiza o cuidado, promove adesão por parte da equipe a boas práticas e evita a ocorrência de eventos adversos. Uma cultura de segurança institucional e organizacional com múltiplas estratégias, integrando líderes, gestores e equipes a ações de conscientização sobre o uso de barreiras de segurança, engajamento e motivação, notificações sobre eventos adversos e consequências não punitivas, além do envolvimento da família durante a internação, treinamentos, capacitações e educação continuada, garantem uma segurança do paciente mais eficaz neste contexto e população específica.

 

 

REFERÊNCIAS

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4.    Matlow AG, Baker GR, Flintoft V, et al. Adverse events among children in Canadian hospitals: the Canadian paediatric adverse events study. CMAJ 2012;184:E709–18. doi: 10.1503/cmaj.112153

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Recebido: 29 de abril de 2024. Aceito: 26 de junho de 2024

Correspondência: Rosemeire Keiko Hangai. E-mail: rosemeire.hangai@hc.fm.usp.br

Conflito de Interesses: os autores declararam não haver conflito de interesses

 

 

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