Rev. Adm. Saúde (On-line), São Paulo, v. 24, n. 94: e378, jan. – mar. 2024, Epub 28 mar. 2024

http://dx.doi.org/10.23973/ras.94.378

 

 

ARTIGO ORIGINAL

 

Auditoria interna no âmbito de um hospital filantrópico do Nordeste: um olhar para as glosas efetuadas

Internal audit within the scope of a philanthropic hospital in the northeast: a look at the glosses carried out

 

Erivaldo Santos de Lima1, Geison Cícero da Silva2, Renata de Kassia Barbosa Farias3, Greciane Soares da Silva4

 

 

1.     Graduado em fisioterapia, residente em saúde coletiva no Instituto de Medicina Integral Prof. Fernando Figueira (IMIP), Recife PE

2.     Graduado em enfermagem, especialista em auditoria de serviços de saúde. Filiada ao IMIP, Recife PE

3.     Graduada em enfermagem, especialista em auditoria de serviços de saúde. Filiada ao IMIP, Recife PE

4.     Graduada em odontologia, doutora em saúde internacional. Filiada ao IMIP, Recife PE

 

 

 

RESUMO

O manuscrito discorre sobre as glosas efetuadas por um hospital filantrópico nas contas apresentadas por uma prestadora de serviço e evidencia o impacto do trabalho da equipe de auditoria interna na prevenção de perdas de recursos financeiros. Trata-se de um relato de experiência que tem como base a objetividade dos dados armazenados ao longo do tempo e a subjetividade das pessoas-autoras envolvidas nos processos descritos. Os valores estão expressos em moeda brasileira e a taxa de glosa anual foi calculada por meio de porcentagem. No recorte temporal de seis anos (2017-2022), a favor da instituição contratante, obteve-se resultados superiores à taxa de glosa tida como plausível em todos os anos analisados, o valor total foi de R$4.796.192,68, que equivale a uma taxa média anual de glosa igual a 8,4%. Nesse período, verificou-se um valor médio total de R$ 66.613,19 e os anos de 2021 e 2022 se destacaram com os maiores valores médios (R$ 77.274,45 e R$ 120.662,16, respectivamente). Sugere-se a realização de estudos que avaliem o desempenho da obtenção de glosas pós-implantação de sistemas informatizados; que inclua outros recortes referente às glosas e pesquisas qualitativas que ajudem compreender a perspectiva de gestores e trabalhadores envolvidos diretamente nesse processo vistas ao compartilhamento de potencialidades e fragilidades da auditoria em saúde.

Palavras-chave: administração em saúde; gestão financeira; hospitais filantrópicos.

 

ABSTRACT

The manuscript discusses the disallowances made by a philanthropic hospital in the accounts presented by a service provider and highlights the impact of the work of the internal audit team in preventing losses of financial resources. This is an experience report based on the objectivity of the data stored over time and the subjectivity of the authors involved in the processes described. The values ​​are expressed in Brazilian currency and the annual disallowance rate was calculated as a percentage. In the six-year time frame (2017-2022), in favor of the contracting institution, results were obtained that were higher than the disallowance rate considered plausible in all years analyzed, the total value was R$ 4,796,192.68, which is equivalent at an average annual disallowance rate equal to 8.4%. During this period, there was a total average value of R$ 66,613.19 and the years 2021 and 2022 stood out with the highest average values ​​(R$ 77,274,45 and R$ 120,662.16, respectively). It is suggested that studies be carried out to evaluate the performance of obtaining post-implementation glosses of computerized systems; that includes other excerpts referring to glosses and qualitative research that helps understand the perspective of managers and workers directly involved in this process to share the potentialities and weaknesses of health auditing.

Keywords: health administration; financial management; hospitals, voluntary.

 

 

 

INTRODUÇÃO

Os hospitais filantrópicos representam uma parcela expressiva quanto à oferta de serviços junto ao sistema público de saúde (principalmente no âmbito hospitalar) e têm o SUS e as operadoras de planos de saúde (OPS) como principais fontes de financiamento1,2. Pesquisa realizada por meio do Sistema de Cadastros Nacionais de Estabelecimentos de Saúde (SCNES) constatou considerável aumento da participação destas instituições no sistema público de saúde nos últimos anos3.

Tais instituições podem assumir papel duplo e de forma simultânea: o de prestador de serviços (ao SUS) e o de contratante junto a outros prestadores de serviço. Quando na condição de prestadora, no ano de 2019, verificou-se que OPS filantrópicas apresentaram despesas superiores à receita, tal fato aponta para um grande desafio: a manutenção da saúde financeira destas entidades4.

No contexto de prestação de serviços de saúde, tendo em vista o crescimento gradativo das despesas com o setor5, faz-se necessária a utilização de instrumentos de controle, vistas à gestão de recursos financeiros, prestação de contas e transparência pública, é nesse cenário que a auditoria em saúde desempenha papel crucial.

Entende-se por auditoria: [...] o exame sistemático e independente dos fatos pela observação, medição, ensaio ou outras técnicas apropriadas de uma atividade, elemento ou sistema para verificar a adequação aos requisitos preconizados pelas leis e normas vigentes e determinar se as ações e seus resultados estão de acordo com as disposições planejadas. A auditoria, por meio da análise e verificação operativa, possibilita avaliar a qualidade dos processos, sistemas e serviços e a necessidade de melhoria ou de ação preventiva/corretiva/saneadora6:15.

Durante o processo de auditoria, pode acontecer de haver incoerências quanto aos itens cobrados na conta hospitalar e os documentos comprobatórios apresentados pela instituição prestadora de serviço ou discordância no que se refere a algum item apresentado na fatura à fonte pagadora, é nessa conjuntura que surgem as conhecidas glosas. As glosas acarretam perdas financeiras para a prestadora de serviços, já que pode ocorrer o não pagamento de alguns itens da conta7.

Conceitualmente, as glosas podem ser classificadas como administrativas ou técnicas, estas são intimamente ligadas à assistência ofertada pelo serviço de saúde e podem ser ocasionadas devido a situações como o mal preenchimento do prontuário da pessoa usuária, aquelas dizem respeito a problemas burocráticos diversos8.

Do ponto de vista da instituição que efetua as glosas (contratante), a prática é benéfica tendo em vista que o não dispêndio com itens em desconformidade favorece a sustentabilidade do serviço - principalmente quando se trata de um hospital filantrópico. Em estudo realizado em um hospital de ensino, o trabalho realizado pela equipe de auditoria interna, no ano de 2011, evitou despesa de R$ 628.554,559.

No âmbito hospitalar, as equipes de auditoria geralmente são compostas por profissionais médicos e enfermeiros, entretanto Oliveira e Oliveira10 destacam a importância de que outros profissionais da saúde integrem esses grupos visando ao olhar ampliado para a atenção-gestão e acarretando maior assertividade.

A principal fonte de coleta de dados das equipes de auditoria é o prontuário do paciente, devendo este fornecer informações precisas e coerentes com os procedimentos/serviços realizados durante o seu período de estadia no serviço de saúde, assim, é crucial que os profissionais prestadores do cuidado se atenham a importância da qualidade dos registros, assim como, disponham de instrumentos e protocolos visando à qualidade não só dos dados gerados, mas do cuidado da pessoa usuária como um todo 7,11,12 .

Considerando a relevância do trabalho em que a glosa aplicada trouxe uma perspectiva positiva em relação a sustentabilidade da instituição, a importância que a auditoria desempenha frente ao setor saúde, a predominância de estudos que descrevem o fenômeno das glosas a partir de uma perspectiva negativa (do ponto de vista da instituição glosada), os poucos artigos atualizados que tratam do tema no contexto de hospital filantrópico e ainda, a importância/necessidade de estudos que corroborem o fortalecimento da área, o manuscrito tem por objetivo relatar sobre as glosas efetuadas por um hospital filantrópico entre os anos de 2017 a 2022 nas contas apresentadas por uma prestadora de serviços e evidenciar o impacto do trabalho da equipe de auditoria interna na prevenção de perdas de recursos financeiros.

 

MÉTODO

Trata-se de um relato de experiência a partir do trabalho desenvolvido em uma instituição hospitalar de caráter filantrópico com recorte temporal de seis anos. O objeto de reflexão foi a parceria entre o hospital e uma prestadora de serviços no contexto da auditoria em saúde.

Os relatos de experiência são compreendidos “[...] como um trabalho de linguagem, uma construção que não objetiva propor a última palavra, mas que tem caráter de síntese provisória, aberta à análise e à permanente produção de saberes novos e transversais”13:235.

Daltro e Faria13 pontuam alguns elementos imprescindíveis à realização desse tipo de trabalho, a saber: o entendimento do relato como construção de narrativas; a relação autor e participante, ou seja, o relato parte de um cenário real vivenciado por pelo menos uma das pessoas autoras; aquilo que se descreve tem potencial de gerar novas inquietações e contribui com a superação de desafios; apresenta um referencial teórico que revela o “lugar de fala” da autoria; dispõe de linguagem que possa ser extrapolada para além do público de pesquisadores da área; não lança mão de conclusões, mas aponta fragilidades que porventura foram encontradas.

Compõem este manuscrito alguns elementos objetivos: dados produzidos e armazenados pela equipe em planilhas do Microsoft Office Excel (aqui apresentados em R$, em média e em porcentagem) e subjetivos, como, por exemplo, as reflexões advindas do cotidiano frente ao desenvolvimento do trabalho em auditoria; a partir de trocas e conversas informais no serviço; da participação em eventos internos e externos e das vivências pessoais dos autores nos mais variados contextos.

A taxa de glosa (em se tratando de um dos dados objetivos) foi calculada da seguinte forma: valor total da glosa dividido pelo valor total faturado (valores anuais), sendo o resultado multiplicado por 100. Assim, obteve-se o valor em porcentagem da taxa de glosa (considerou-se uma casa decimal sem arredondamento).

Salienta-se que este relato não se trata de pesquisa com seres humanos, mas com dados secundários e sem a identificação de sujeitos, fato que torna não mandatória a submissão em Comitê de Ética em Pesquisa (CEP).

 

Breve caracterização do lócus de experiência

O hospital objeto da experiência localiza-se no Nordeste brasileiro, possui caráter filantrópico, de grande porte, oferta seus serviços integralmente por intermédio do SUS em ações que perpassam o nível de baixa densidade tecnológica (com ações voltadas ao apoio institucional e cogestão no âmbito da Atenção Primária à Saúde), intermediária (ambulatorial e hospitalar) e alta densidade tecnológica, além disso, destaca-se frente à formação de profissionais de saúde, principalmente, pelos seus cursos lato-sensu (programas de residência) e stricto-sensu (mestrado e doutorado)14.

Alguns números do ano de 2022 ilustram a importância do hospital para a região em que se insere, como também para regiões em que oferta serviços de referência - registraram-se atendimentos a usuários de todas as regiões do País - a instituição realizou um total de 864.155 atendimentos, 50.916 internamentos, 14.255 cirurgias, 391 transplantes, 2.311.567 exames de análises clínicas, 266.755 exames de imagem etc.14.

Atualmente, o setor de faturamento hospitalar possui uma coordenação geral, 03 profissionais que prestam suporte à coordenação, 05 supervisores de AIH (Autorização de Internação Hospitalar), 05 auditores (de gestão/enfermagem) e 02 médicos (auditoria médica), 17 faturistas, 06 jovens aprendizes e 01 profissional de saúde residente (em saúde coletiva).

 

Fluxo dos processos

Na posição de contratante junto de uma prestadora de serviços, a partir de uma agenda pactuada entre as partes, estabelece-se os prazos de envio dos documentos, revisão (auditoria) e consenso (no que concerne aos valores apresentados e glosados).

Atualmente, a disponibilização dos documentos-base para o trabalho da auditoria se dá por intermédio de um sistema informatizado da própria prestadora, quando necessária a complementaridade de alguma informação, realiza-se ainda a checagem no PEP da instituição contratante.

Após o recebimento da fatura apresentada pela prestadora de serviço, proceder-se-á a auditoria e quando cabível a glosa será aplicada, nestes casos - podendo a parte contratada apresentar justificativas para a retenção de recursos pela fonte pagadora - ocorre a reunião de consenso em que é estabelecido o valor final da fatura. Depois desse processo, a conta final seguirá para o setor responsável efetuar o pagamento.                     

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

No Quadro 1, apresenta-se o panorama das glosas efetuadas durante os anos de 2017 a 2022, o valor da fatura posto pela prestadora de serviço, o valor glosado e o valor final pago e ainda, a taxa de glosa. Salienta-se que os valores abaixo descritos se referem apenas à produção eletiva.

 

Quadro 1. Glosas efetuadas expressas em reais (R$).

ANO

VALOR APRESENTADO (R$)

VALOR GLOSADO (R$)

VALOR PAGO (R$)

TAXA DE GLOSA (%)

2017

9.114.895,35

510.676,98

8.604.218,37

5,9

2018

10.468.731,36

515.354,65

9.953.376,71

5,1

2019

11.169.338,18

852.903,73

10.316.434,45

8,2

2020

8.434.354,67

542.018,02

7.892.336,65

 6,8

2021

9.953.361,11

927.293,40

9.026.067,71

10,2

2022

11.847.014,76

1.447.945,90

10.399.068,86

13,9

TOTAL

60.987.695,43

4.796.192,68

56.191.502,75

8,4

 

No recorte temporal, observa-se que o valor total apresentado pela prestadora foi de R$ 60.987.695,43 e que os anos de 2019 e 2022 representam as maiores faturas (R$ 11.169.338,18 e R$ 11.847.014,76, respectivamente). No que se refere aos valores glosados, obteve-se um total de R$ 4.796.192,68, que equivale a uma taxa média de glosa igual a 8,4%. Os anos de 2021 e 2022 apresentaram maior taxa de glosa, sendo 10,2% e 13,9% (nesta ordem).

Convém destacar, que diante do não pagamento de um ou mais itens cobrados pela prestadora de serviços, a instituição prestadora pode ou não acatar a justificativa posta pela contratante, nesse caso, utilizar-se-á do que é conhecido como recurso de glosas11. Diante disso, o valor outrora glosado pode não ser igual ao valor final pago. No presente estudo, levou-se em consideração apenas o valor final (acatado).

Em estudo realizado em dois hospitais privados (médio e grande porte) da região sudeste, verificou-se taxa de glosa anual acima de 10,90% na instituição de médio porte e de 5,44% na de porte superior, em reais, os valores percentuais equivalem a R$ 1.805.102,31 e R$ 3.167.527,7215.

Na região nordeste, a pesquisa de Cintra, Souza e Souza16 realizada em um hospital militar obteve taxa de glosa de 4,5%, entretanto, apresenta importante limitação de recorte temporal (considerou apenas um mês). Na contramão, em estudo realizado em um hospital de médio porte, na região sudeste, constatou-se que a instituição deixou de faturar no primeiro semestre de 2019 um montante de R$ 331.244,62 em decorrência das glosas recebidas17.

Fica claro, portanto, o fenômeno das glosas como uma potencialidade para a instituição que obtém altas taxas junto de suas prestadoras de serviço e como uma fragilidade para os serviços que recebem a retenção de seus recursos, em ambos os casos se depende de um bom trabalho da equipe auditora.

Defende-se18 que as prestadoras de serviços de saúde visem a não ocorrência de glosas, mas consideram-se aceitáveis as taxas em torno de 3% (para a instituição glosada), neste relato de experiência, a favor da instituição contratante, obteve-se resultados superiores à taxa tida como plausível em todos os anos analisados (com destaque para os anos de 2021 e 2022).

O trabalho de prevenção de perdas de recursos financeiros proporcionados pelas equipes de auditoria em saúde favorece a sustentabilidade das instituições. Defende-se que “[...] a auditoria em saúde vem buscar contribuir e melhorar o equacionamento da gestão otimizando uma melhor alocação de recursos financeiros em saúde” 19:09.

Ao encontro desse pensamento “As instituições de saúde, de modo geral, buscam a qualidade nos serviços prestados, sem perder o foco da sustentabilidade, pois lidam com um pensamento empresarial, requerendo associar baixos custos com a concorrência e excelência no atendimento prestado”20:10.

A favor tanto das instituições auditoras quanto das partes auditadas, as inovações tecnológicas na área saúde e ferramentas como os prontuários eletrônicos corroboram o processo de registro, qualidade das informações e consequentemente a gestão da clínica e dos recursos financeiros, já que a base primordial de consulta da auditoria é o prontuário e que uma letra ilegível é o suficiente para acarretar glosa21.

Em outras palavras, acredita-se que os registros eletrônicos ao tempo que podem ajudar as prestadoras de serviços na redução de suas taxas de glosas, visto que confere maior legibilidade às informações7,21, também podem potencializar o desempenho de instituições que se beneficiam com o não pagamento total dos valores requeridos pelas ofertantes de serviços (dado o nível de detalhamento que proporciona e com isso, favorece uma avaliação mais apurada da equipe de auditoria).

Um desafio para as instituições, no cenário dos registros eletrônicos, é a inovação e a ampliação de olhar dos profissionais envolvidos na atenção-gestão para as potencialidades que a informatização da saúde pode trazer ao trabalho de auditoria. Sousa e Acunã22 relataram sobre a automatização do processo de cobranças inerentes a um centro cirúrgico, em um hospital filantrópico de São Paulo, que resultou no aumento de faturamento de 13%.

As Tecnologias de Informação e Comunicação têm sido utilizadas em diversos contextos vistas ao suporte às equipes de auditoria, são exemplos: a utilização de aplicativos como o “Oncoaudit” - voltado ao contexto de medicamentos em oncologia - e o desenvolvimento de sistemas inteligentes para detecção de situações auditáveis com o objetivo de otimização de tempo e assertividade no trabalho23,24.

A Figura 1 evidencia a evolução das glosas efetuadas pela equipe de auditoria do hospital nos últimos anos (2017-2022).

 

Figura 1. Evolução das glosas (média em reais) do período entre 2017 e 2022.

Gráfico

 

Entre os anos de 2017 e 2022, verificou-se um valor médio total (em R$) de R$ 66.613,19. Ao esmiuçar os dados, os anos de 2021 e 2022 se destacam com os maiores valores médios (R$ 77.274, 45 e R$ 120.662,16 nesta ordem). Em relação ao ano de 2017, considerando o valor total, houve um aumento de 183%, que pode ser explicado por fatores, como, por exemplo, reajustes nos valores da tabela negociada entre as partes ao longo dos anos, aumento no número de procedimentos e o investimento em capacitação de pessoal.

Sobre o impacto positivo que as equipes de auditoria proporcionam às organizações de saúde sustenta-se que este “[...] apresenta grande valia no que tange ao progresso de aparelhamento hospitalar em desenvolvimento de novas metodologias influenciando diretamente nos custos e qualidade ao usuário da saúde” 25:8.

As práticas de auditagem têm potencial para a indução de mudanças nos processos de trabalho, já que podem evidenciar lacunas nos modos de fazer assistência à saúde de determinada instituição, como também em relação à gestão e diante disso, mobilizar os diversos atores institucionais para revisitar práticas, fluxos, protocolos etc.26,27.

Trata-se, portanto, de uma ferramenta favorecedora da Educação Permanente em Saúde (EPS), apesar de notar-se em grande parte dos estudos sobre auditoria a utilização da expressão “Educação Continuada” deve-se ampliar o olhar, já que esta embora contribua em alguma medida com a EPS, é feita com ações pontuais, tem caráter uni profissional, metodologias educativas tradicionais, ou seja, apresenta pouco poder de transformação do processo de trabalho considerando os preceitos da Política Nacional de Educação Permanente em Saúde28.

No que concerne aos principais desafios encontrados durante a experiência destacam-se: a institucionalização da EPS, materializada na dissociabilidade persistente entre trabalho-educação, ou seja, as práticas educativas (intrasetorial e intersetorial) tendem a ser vistas como atividades suplementares ao trabalho cotidiano e não como inerentes, o que por vezes, para realizar uma implica prejuízo em outra; o alinhamento e a comunicação entre o setor de auditoria e outros setores internos; a manutenção das pactuações e contratualizações entre o hospital e a prestadora de serviços.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente relato discorreu sobre as glosas hospitalares efetuadas pela auditoria interna de um hospital filantrópico de grande porte nas contas apresentadas por uma prestadora de serviço evidenciando a importância do trabalho de prevenção de perdas de recursos financeiros. Observou-se taxa média anual de glosa obtida de 8,4%, que representa a prevenção de perda de R$ 4.796.192,68 para o hospital.

O estudo em tela inova ao apresentar um amplo recorte temporal - quando comparado aos demais trabalhos publicados sobre a temática -, pelo lócus de vivência ser um hospital de caráter filantrópico de grande porte e que atende ao SUS exclusivamente, e ainda, pela perspectiva positiva diante da glosa.

Em se tratando das limitações do estudo, em relação aos seus aspectos metodológicos, destacam-se: o fato de o relato de experiência ter caráter singular, embora contribua com a construção de novos saberes-fazeres, as suas reflexões não são generalizáveis e podem não ser aplicáveis a outros contextos; a ausência de outros recortes referentes à glosa, como, por exemplo, a prevalência quanto ao tipo (administrativa ou técnica), principais motivos de não pagamento etc.

Como perspectivas, sugere-se a realização de estudos que avaliem o desempenho da obtenção de glosas pós-implantação do prontuário eletrônico ou de outros sistemas informatizados, considerando que o período a qual o relato se refere a instituição ainda não havia implantado o prontuário eletrônico (foi implantado integralmente em 2023); pesquisas que abordem as glosas sob diversos recortes (tipos, principais motivos etc.) e estudos qualitativos que ajudem compreender a perspectiva de gestores e trabalhadores envolvidos diretamente nesse processo vistas ao compartilhamento de potencialidades e fragilidades da auditoria em saúde.

“É por meio da socialização das experiências que há a possibilidade de construir soluções cada vez mais assertivas para os complexos problemas que surgem no cotidiano das organizações” 29:13.

 

 

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Recebido: 29 de fevereiro de 2024. Aceito: 28 de março de 2024

Correspondência: Erivaldo Santos de Lima. E-mail: erivaldolimah@gmail.com

Conflito de Interesses: os autores declararam não haver conflito de interesses

 

 

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