Rev. Adm. Saúde (On-line), São Paulo, v. 23, n. 91: e350, abr. – jun. 2023, Epub 28 jun. 2023

http://dx.doi.org/10.23973/ras.91.350

 

 

ARTIGO DE REVISÃO

 

Telemedicina, telessaúde e digitalização: revisão sistemática utilizando o protocolo prisma (2020-2022)

Telemedicine, telehealth and digitalization: systematic review using the prisma protocol (2020-2022)

 

Francisca Noeme Moreira de Araújo1, Marcelo Victor Alves Bila Queiroz2, Walid Abbas El Aouar3

 

1. Mestre em administração pela Universidade Potiguar, Natal RN

2. Doutor em administração. Professor do Programa de Pós-graduação em Administração da Universidade Potiguar, Natal RN

3. Doutor em administração. Professor do Programa de Pós-graduação em Administração da Universidade Potiguar, Natal RN

.

 

 

 

RESUMO

Objetivo: Realizar uma revisão sistemática da literatura sobre as temáticas: telemedicina, telessaúde e digitalização da saúde, considerando o período de 2020 a 2022. Proposta: A pandemia provocada pelo covid-19 afetou o formato na execução e entrega dos serviços, exigindo rápida transformação e adaptação por parte das empresas. Na área da saúde, especificadamente em atendimentos realizados pelo SUS, houve uma redução 42,5% em procedimentos de consultas médicas, o que pode contribuir com o represamento de atendimentos e ocasionar sobrecarga no SUS pelos próximos anos. Para a realização da pesquisa, foram escolhidas três bases de dados: Spell, Scielo e PubMed, resultando, após a filtragem, em 14 artigos. Conclusões: Os estudos apontam que ainda não há um consenso a respeito do conceito de telemedicina na literatura, e que de modo geral, a modalidade foi bem aceita pelos usuários. A temática teve crescimento significativo a partir de 2020, a respeito de pesquisas realizadas, desta forma, é possível afirmar que esta é uma área de pesquisa promissora e que necessita de estudos empíricos mais aprofundados especialmente na área da administração.

Palavras-chave: Telemedicina. Telessaúde. Digitalização da saúde. Revisão Sistemática

 

ABSTRACT

Objective: Conduct systematic review of the literature on the topics of telemedicine, telehealth, and digitization of healthcare, considering the period from 2020 to 2022. Proposal: The pandemic caused by Covid-19 affected the service execution and delivery way, requiring rapid transformation and adaptation from companies. In the healthcare field, specifically in services provided by the Brazilian Unified Health System (SUS), there was a reduction of 42.5% in medical consultations, which may contribute to a backlog of services and overload the SUS for the next few years. Three databases were chosen for the research: Spell, Scielo, and PubMed, resulting in 14 articles after a data filtering. Conclusions: Studies indicate that there is still no consensus on the concept of telemedicine in the literature, however, this modality healthcare service has been well accepted by its users. This subject has had significant growth in research conducted since 2020, thus it is possible to attest that this is a promising research area that requires more in-depth empirical studies, especially in the area of administration science (public administration, governance, or management).

Keywords: Telemedicine. Telehealth. Digitization of healthcare. Systematic review

 

 

 

INTRODUÇÃO

O avanço tecnológico tem contribuído substancialmente com a transformação da operacionalização dos processos organizacionais. Alguns segmentos já desfrutam da digitalização dos seus processos há algum tempo, outros seguimentos emergiram mais recentemente, especialmente, após o surgimento da covid-19, a qual inseriu o mundo em um contexto de desafios e modificou a rotina de milhões de pessoas no mundo todo (Kitchen, 2020). Dessa forma, o processo de digitalização foi acelerado, assim como as mudanças nos hábitos de consumo de produtos e serviços (Jesus et al, 2020).

No âmbito da saúde, foram necessárias adaptações para continuidade da prestação dos serviços e, neste contexto, a telemedicina se fortaleceu. Para Mengesha & Garfield (2019), a telemedicina é uma oportunidade para superar barreiras logísticas para a prestação de serviços da saúde. A prática da telemedicina acontece em diferentes partes do mundo, mas ainda enfrenta controvérsias e resistência dos profissionais da área, sobretudo dos médicos, por defenderem que a prática impossibilita identificar elementos importantes para realização de exames, segurança das informações e acesso à tecnologia (Palma, et al., 2021). No Brasil, o Congresso Nacional, em 2020, aprovou a Lei nº 13.989/20, a qual autoriza a regulamentação da telemedicina em caráter excepcional, para uso durante a pandemia, oportunizando a experiência dos brasileiros no que se refere ao atendimento de saúde à distância estimulando a discursão sobre a continuidade dessa prática.

Em 2022, foi publicado no Diário Oficial da União, pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), a Resolução nº 2.314/2022, que “define e regulamenta a telemedicina, como forma de serviços médicos mediados por tecnologias de comunicação” (Conselho Federal de Medicina, 2022). A partir da publicação, a prática da telemedicina passou a ser liberada em caráter permanente e não apenas de forma provisória.

Conforme já mencionado, a discursão a respeito da telemedicina não é atual, porém ainda existem lacunas sobre a temática, especificadamente em relação a sua adequação ao uso, tanto por profissionais, como usuários (Caetano, et al. 2020). Ainda há falta de consenso quanto a definição e diferenças entre os conceitos na literatura, no que se refere à telemedicina, telessaúde e digitalização da saúde. Alguns autores tratam esses termos como sinônimos, enquanto outros defendem abordagens distintas (Santos, 2020). De acordo com a Resolução nº 2.314/2022 (CFM), “o termo telessaúde é amplo e abrange outros profissionais da saúde, enquanto telemedicina é específico para a medicina e se refere a atos e procedimentos realizados ou sob responsabilidade de médicos” (Conselho Federal de Medicina, 2022).

Durante a pandemia, a discursão a respeito da implementação da telemedicina ganhou força, especialmente, a redução de 42,5%, nas consultas presenciais, não covid, realizadas pelo SUS (Fundação Getúlio Vargas, 2022). Em contrapartida, 7,5 milhões de atendimentos foram realizados via telemedicina, no período entre 2020 e 2021 (Saúde Digital, 2021). Em função do debate em torno tema, pesquisadores despertaram o interesse na realização de estudos voltados à área. Negreiros et al. (2021), realizou um estudo de revisão sistemática e teve como objetivo mapear as evidências sobre a utilização de tecnologias digitais no cuidado a pessoas com diabetes melitus durante a pandemia de covid-19. A pesquisa de Domingues et al. (2020) focou sua revisão em uma temática específica, a qual corresponde a área da neurologia e consultou apenas a base de pesquisa da PubMed, identificando contribuições e benefícios da telemedicina para o diagnóstico e tratamento na área.

Diante do exposto, o objetivo de pesquisa deste trabalho é investigar as tendências de pesquisa na literatura de gestão e saúde sobre telemedicina no período de 2020 a 2022.

 

 

 

 

MÉTODOS

Para a realização da revisão sistemática foram selecionadas três bases de dados: Scientific Periodicals Electronic Librar (SPEEL), Scientific Electronic Library Online (SciELO) e PubMed. Elas foram escolhidas pela relevância, credibilidade e abrangência dos materiais dispostos, e em específico a PubMed por referência em trabalhos da área da saúde.

As palavras-chave de buscas utilizadas foram: “digitalização da saúde”, “telessaúde”, “telemedicina”. Os termos foram pesquisados individualmente e combinados: “telessaúde + telemedicina”, “telessaúde + digitalização da saúde”, “telemedicina + digitalização da saúde”, “telessaúde + telemedicina + digitalização da saúde”. O período considerado para pesquisa foi de artigos publicados a partir de janeiro de 2020, o qual corresponde o ano da regulamentação da prática de telemedicina no Brasil. A seleção dos artigos foi realizada com base nas diretrizes estabelecidas no método PRISMA (Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses), conforme descrito por Moher, et al. (2009). A Figura 1 detalha o fluxo da seleção dos artigos.

 

Figura 1. Fluxo do processo de seleção dos artigos. Fonte: elaborado de acordo com o modelo de Moher et al. (2009).

 

No total foram localizados 241 artigos, sendo 131 na PubMed, 107 na Scielo e 3 na Spell. Sendo que, um artigo foi localizado tanto na PubMed, como na Scielo. Para a busca, não houve restrição quanto ao idioma do artigo.

Na etapa da triagem, os estudos que divergiam da perspectiva do objeto desta pesquisa foram excluídos, tais como: os artigos que abordam questões técnicas da área da saúde, artigos de revisão de literatura, caso de ensino, relatos de experiência e pesquisas realizadas fora do Brasil. De 241 artigos, 77 foram selecionados para avaliação da elegibilidade.

A etapa de análise de elegibilidade, foi dividida em dois momentos: no primeiro, os trabalhos foram avaliados por meio do resumo, com o objetivo de aprofundar a leitura e compreender a proposta do artigo analisado. De 72 artigos, 38 foram selecionados para o segundo momento. Os artigos foram lidos na íntegra, e foi identificado que 14 artigos elegíveis quanto à adequação da temática em estudo. O Quadro 1, apresenta as informações básicas dos artigos selecionados.

 

Quadro 1. Síntese dos artigos analisados.

Ordem

Autores

Base

Ano

Título

Periódico

Qualis CAPES

Artigo 1

Lara et al. (2021)

Scielo

2022

Orthopaedic telemedicine services during the current novel coronavirus pandemic

 Acta Ortopédica Brasileira

Sem Qualis

Artigo 2

Katz, et al. (2020)

Scielo

2020

Acesso e regulação ao cuidado especializado no Rio Grande do Sul: a estratégia RegulaSUS do TelessaúdeRS-UFRGS

Revista Ciência & Saúde Coletiva

A1

Artigo 3

Accorsi, et al. (2020)

Scielo

2020

Assessment of patients with acute respiratory symptoms during the COVID 19 pandemic by Telemedicine: clinical features and impact on referral

Einstein (São Paulo)

A4

Artigo 4

Garcia Saiso, et al. (2021)

Pubmed

2021

Barreras y facilitadores a la implementación de la telemedicina en las Américas

Revista Panamericana de Salud Pública

A3

Artigo 5

Couto, et al. (2021)

Scielo

2022

Telehealth in the pregnancy-puerperal period: complementary health strategy in a pandemic scenario

Texto & Contexto Enfermagem

A3

Artigo 6

Souza, et al. (2021)

Scielo

2021

A uberização do trabalho em saúde: expansão no contexto da pandemia de Covid 19

Trabalho, Educação e Saúde

B1

Artigo 7

Freitas, et al. (2021)

Scielo

2021

Análise dos atendimentos realizados pelo telessaúde COVID em um município de Minas Gerais

 Revista Brasileira de Epidemiologia

A3

Artigo 8

Silva, et al. (2021)

Scielo

2021

O Papel da Telessaúde na Pandemia Covid 19: Uma Experiência Brasileira

Revista Ciência & Saúde Coletiva

A1

Artigo 9

Moreira, et al. (2021)

Scielo

2021

Telemedicina em Cardiologia para Seguimento Ambulatorial de Pacientes com Alto Risco Cardiovascular em Reposta à Pandemia de COVID 19

 Arquivos Brasileiros de Cardiologia

Sem Qualis

Artigo 10

Miziara, et al. (2021)

Scielo

2021

Teleoncology Orientation of Low-Income Breast Cancer Patients during the COVID 19 Pandemic: Feasibility and Patient Satisfaction

Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia

Sem Qualis

Artigo 11

Schroder, et al. (2021)

Scielo

2021

Telessaúde em um centro de referência em Diabetes Mellitus: uma análise transversal

 Escola Anna Nery

B1

Artigo 12

Palma, et al. (2020)

Spell

2021

Fatores que Influenciam a Aceitação de Telemedicina por Médicos no Brasil

Revista Alcance

A4

Artigo 13

Macharet, et al. (2022)

Pubmed

2022

Patient Acceptance of Telemedicine in Urogynecology Consultations - A Cross-Sectional Study Performed at a Brazilian Public Institution

Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia

Sem Qualis

Artigo 14

Peixoto, et al. (2022)

Scielo

2022

Drivers for Teleconsultation Acceptance in Brazil: Patients’ Perspective during the COVID 19 Pandemic

Revista de Administração Contemporânea

A2

 

Em seguida, os artigos selecionados foram analisados de acordo com as categorias: área de conhecimento, tipo da pesquisa, amostra/sujeitos da pesquisa, método de coleta, método(s) de análise dos dados, resultados, dificuldades na condução da pesquisa (limitações) e sugestões para pesquisas futuras (novos direcionamentos).

 

RESULTADOS

A tecnologia e a transformação digital têm exigido mudanças nos processos organizacionais e contribuído para alterações no formato da prestação de serviço, a partir da substituição de tarefas mais manuais, por processos automatizados (Santos, et al. 2022). Empresas do segmento bancário por exemplo, já vem vivenciando a digitalização dos processos mais efetivamente (Simões, et al. 2022), enquanto outro segmento, como o caso de serviços de saúde, emergiu nessa tendência mais recentemente.

Porém, essa é uma realidade que vem mudando, especialmente após o surgimento da pandemia causada pelo covid-19, especialmente em países da América Latina, onde a adoção da telemedicina ainda é baixa, quando comparada com países desenvolvidos (Nittari, et al. 2022). O interesse pela temática também cresceu após o surgimento da pandemia, conforme observado nas bases de pesquisa utilizadas para esta pesquisa.

Referente os artigos incluídos nesta pesquisa, foram considerados 14 artigos, todos publicados em periódicos, e estes refletem as contribuições de duas áreas: saúde e administração.  Apenas um artigo está publicado em periódico da área de administração, os outros 13, em periódicos específicos da área da saúde. No entanto, 10 artigos estão publicados em periódicos que possuem Qualis na área de administração, sendo dois em periódicos Qualis A1, um em periódico Qualis A2, três em periódicos Qualis A3, dois em periódicos Qualis A4 e dois em periódicos Qualis B1. A publicação desses artigos em periódicos que possuem Qualis de relevância, evidencia a importância que a temática vem obtendo nos últimos tempos, e a predominância de artigos na área da saúde, é compatível com a temática discutida.

Relacionado a construção do referencial teórico, não foi possível identificar a predominância de nenhum autor ou base teórica para construção do referencial dos 14 artigos analisados, no entanto, pode-se afirmar que para construção do arcabouço teórico, os autores recorreram predominantemente para literatura internacional.

O Quadro 2, apresenta o resumo da abordagem adotada, tipo de pesquisa, técnica de coleta de dados e método de análise de dados, estudados em cada artigo.

 

Quadro 2. Aspectos metodológicos.

Autores

Título

Abordagem

Tipo de pesquisa

Técnica de coleta de dados

Método de análise

Lara et al. (2021)

Orthopaedic telemedicine services during the current novel coronavirus pandemic

Não identificado

Documental

Análise retrospectiva de arquivos

Não identificado

Katz, et al. (2020)

Acesso e regulação ao cuidado especializado no Rio Grande do Sul: a estratégia RegulaSUS do TelessaúdeRS-UFRGS

Não identificado

Documental

Análise retrospectiva de arquivos

Escala Likert, e a análise dos dados, se deu por meio do cálculo da média e desvio padrão

Accorsi, et al. (2020)

Assessment of patients with acute respiratory symptoms during the COVID 19 pandemic by Telemedicine: clinical features and impact on referral

Não identificado

Documental

Análise retrospectiva de arquivos

Estatística descritiva e regressão

Garcia Saiso, et al. (2021)

Barreras y facilitadores a la implementación de la telemedicina en las Américas

Não identificado

Exploratório

Não identificado

Não identificado

Couto, et al. (2021)

Telehealth in the pregnancy-puerperal period: complementary health strategy in a pandemic scenario

Não identificado

Exploratório

Não identificado

Não identificado

Souza, et al. (2021)

A uberização do trabalho em saúde: expansão no contexto da pandemia de Covid 19

Não identificado

Documental

Análise retrospectiva de arquivos

Documentos e notícias relacionadas à temática

Freitas, et al. (2021)

Análise dos atendimentos realizados pelo telessaúde COVID em um município de Minas Gerais

Quantitativa

Documental

Exploratório e analítico

SPSS (Statistical Package for the Social Sciences)

Silva, et al. (2021)

O Papel da Telessaúde na Pandemia Covid 19: Uma Experiência Brasileira

Não identificado

Documental

Análise retrospectiva de arquivos

Estatística descritiva

Moreira, et al. (2021)

Telemedicina em Cardiologia para Seguimento Ambulatorial de Pacientes com Alto Risco Cardiovascular em Reposta à Pandemia de COVID 19

Não identificado

Documental

Análise retrospectiva de arquivos

Software Stata

Miziara, et al. (2021)

Teleoncology Orientation of Low Income Breast Cancer Patients during the COVID 19 Pandemic: Feasibility and Patient Satisfaction

Não identificado

Descritiva

Questionário online

Escala Likert, e a análise dos dados, se deu por meio do cálculo da média e desvio padrão

Schroder, et al. (2021)

Telessaúde em um centro de referência em Diabetes Mellitus: uma análise transversal

Quantitativa

Descritiva

Questionário online

SPSS (Statistical Package for the Social Sciences)

Palma, et al. (2020)

Fatores que Influenciam a Aceitação de Telemedicina por Médicos no Brasil

Qualitativa

Exploratório

Entrevista Semiestruturada

NVivo

Macharet, et al. (2022)

Patient Acceptance of Telemedicine in Urogynecology Consultations - A Cross-Sectional Study Performed at a Brazilian Public Institution

Não identificado

Não identificado

Não identificado

SPSS (Statistical Package for the Social Sciences)

Peixoto, et al. (2022)

Drivers for Teleconsultation Acceptance in Brazil: Patients’ Perspective during the COVID 19 Pandemic

Não identificado

Descritiva

Questionário online

Equações estruturais e utilizou o software AMOS

 

Dos artigos analisados, não é possível identificar nenhuma predominância quanto a abordagem adotada, especialmente pelo fato de 79% não especificar a abordagem utilizada. Referente ao tipo de pesquisa, a maior concentração é de análise documental, correspondendo a 50% dos artigos analisados, e neste caso, o método de coleta de dados foi a análise retrospectiva de arquivos. Ainda três artigos são do tipo pesquisa descritiva e três, pesquisa exploratória. Todos os artigos que são do tipo pesquisa descritiva, utilizou o questionário online, como instrumento de coleta de dados. A respeito dos artigos do tipo exploratória, foi possível identificar em apenas um, o instrumento utilizado, que neste caso foi a entrevista semiestruturada. Esses dados mostram que, referente ao período estudado, houve uma predominância de estudos de análise documental.

Em relação ao método de análise de dados, também não há uma predominância quanto a utilização do tipo, mas observa-se que em 79% dos artigos é possível identificar qual método adotado, bem como se houve adoção de sistema para tratamento dos dados.

 

DISCUSSÃO

Relacionado aos resultados obtidos, todos os artigos evidenciam que os objetivos dos respectivos estudos foram alcançados.

Observa-se a partir das conclusões dos estudos analisados, que a telemedicina vem ganhando espaço na sociedade como um todo. De modo geral, os estudos envolvem de alguma forma usuários/pacientes, exceto o estudo de Palma, et al. (2020), que foi realizado com profissionais da saúde.

Sobre os resultados dos estudos realizados com usuários/pacientes, a pesquisa de Lara et al. (2021), concluiu que os participantes do seu estudo têm abertura para a telemedicina e apresentaram elevado nível de satisfação com a modalidade, chegando até mesmo a recomendar o uso para um amigo ou familiar. A pesquisa conduzida por Miziara, et al. (2021), também obteve como resultado uma avaliação positiva dos participantes “quanto a utilização da telemedicina, além de elevado nível de confiabilidade em relação ao método”.

Os estudos analisados também consideraram aspectos como redução no tempo de espera para atendimento ou reduziu a necessidade de atendimento presencial. Sobre essas considerações, Katz, et al. (2020) informa que a partir do estudo realizado por meio da análise retrospectiva, identificou que houve redução no tempo de espera dos pacientes que estavam esperando por atendimento. As pesquisas realizadas por Accorsi, et al., (2020), Couto, et al. (2021), Freitas, et al. (2021), Silva, et al. (2021), Moreira, et al. (2021) e Schroder, et al. (2021), mesmo realizadas com públicos distintos, chegou a mesma consideração ao confirmar que o uso da telemedicina reduziu a necessidade de atendimento presencial e que de modo geral, os participantes ficaram satisfeitos com a modalidade. Macharet et al. (2022) contribuiu identificando que pessoas com maior nível de escolaridade têm maior aderência à telemedicina. Peixoto et al. (2022), testou um modelo teórico e concluiu que ele é apropriado para a realidade brasileira. De modo geral, os estudos relacionados apresentaram resultados positivos quanto a utilização da telemedicina, e relacionaram os benefícios de sua utilização.

Garcia Saiso, et al (2021), embora tenha considerado que há limitações na telemedicina, como a necessidade de encontros presenciais quando necessário, reforçou os benefícios da modalidade, como melhorar o acesso à saúde e qualidade de vida do paciente, bem como o baixo custo na utilização. Por outro lado, a pesquisa realizada por Souza, et al (2021), apontou que a telemedicina é uma via de precarização do trabalho, corroborando com a pesquisa realizada por Peixoto, et al. (2020), a qual foi realizada com profissionais da saúde, especificadamente médicos, que identificou que a resistência à mudança é o principal fator de recusa da telemedicina da parte deles, e atribui ao receio da mudança propriamente dita.

Em relação a limitação da pesquisa, foi apresentada por seis estudos. Katz, et al. (2020), aponta que a limitação de sua pesquisa se deu pela ausência da comparação da consulta presencial X consulta por meio da telemedicina. Os autores ainda destacam como fator limitante, o perfil investigado, especificadamente a idade e a falta de familiaridade com a tecnologia por parte dos participantes. Freitas, et al. (2021) e Schroder, et al. (2021), consideram como fator limitante a amplitude do estudo, sobretudo, o tamanho da amostra. Macharet et al. (2022), corrobora ao considerar que a principal limitação de sua pesquisa foi pela própria operacionalização, como o período de realização, a abordagem e a limitação territorial, a qual considerou apenas uma única região do Brasil. Por fim, Couto, et al. (2021), informa que a limitação de sua pesquisa se refere à incipiência da temática no Brasil. Considerando as limitações apresentadas, pode-se concluir que ainda há muito o que evoluir a respeito da temática, especialmente ao considerar que os resultados refletem a percepção de um pequeno grupo, em alguns casos, de uma localidade específica. O Quadro 3 apresenta o resumo das limitações dos estudos analisados.

 

Quadro 3. Resumo das limitações da pesquisa.

Principais Limitações

Artigos

Falta de familiaridade com a nova tecnologia

Katz, et al. (2020)

Pesquisas com amostras pouco representativas

Freitas, et al. (2021); Schroder, et al. (2021); Macharet et al. (2022)

Comparativo consulta presencial X telemedicina

Katz, et al. (2020)

Perfil dos entrevistados

Katz, et al. (2020); Macharet et al. (2022)

Baixa discussão da temática

Couto, et al. (2021)

 

Relacionado a sugestões de novas pesquisas, Couto et al. (2021) recomenda que novos estudos relacionados à temática da telemedicina sejam desenvolvidos e que sejam realizadas capacitações com profissionais da saúde referente ao atendimento virtual, corroborando, Macharet, et al. (2022) recomendam a realização de estudos para avaliar a eficiência e a viabilidade da telemedicina propriamente dita, esta mesma sugestão é feita por Schroder, et al. (2021), onde os autores consideram que trabalhos futuros devem ser realizados para confirmar e ampliar os achados. Como pode-se perceber, os autores de modo geral, recomendam a expansão das pesquisas, com vistas a fortalecer ou confirmar a utilização da telemedicina.

A sugestão de Palma, et al. (2020) segue a mesma perspectiva dos estudos citados, os autores recomendam o aprofundamento na discussão da temática, além da definição e esclarecimento da modalidade, focando a normatização, legalização e difusão do tema, com foco na classe médica. Importante destacar que o CFM publicou em 2022 uma resolução, já citada neste artigo, que regulamenta a telemedicina no Brasil e define aspectos importantes de sua utilização.

As sugestões de Peixoto, et al. (2022) referem-se ao desenvolvimento de um estudo que seja possível “incluir uma compreensão longitudinal do impacto da pandemia de covid-19 na aceitação da telemedicina pelos consumidores”. Como o estudo realizado pelos autores foi direcionado a uma área específica, sugere-se ainda que a novas pesquisas incluam outros serviços da área da saúde, além disso, ainda recomendam a realização de uma pesquisa que possa incluir outros “fatores tecnológicos na busca de antecedentes da propensão dos pacientes em adotar a teleconsulta”.

 

 

 

 

 

 

Quadro 4. Resumo sugestão de novas pesquisas

Principais Sugestões

Artigos

Realização de novas pesquisas abordando a temática telemedicina

Couto et al. (2021); Schroder, et al. (2021); Palma, et al. (2020); Peixoto, et al. (2022)

Realização de treinamento para os profissionais da saúde

Couto et al. (2021)

Estudo sobre eficiência e viabilidade da telemedicina

Macharet, et al. (2022)

Utilização da tecnologia

Peixoto, et al. (2022)

 

Como pode-se observar nos resultados apresentados, as recomendações de novas pesquisas propostas pelos autores, reforçam a necessidade de expansão de pesquisas relacionadas à telemedicina, bem como a compreensão da modalidade e aplicabilidade pelos envolvidos: profissionais da saúde e usuários do serviço.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo desta pesquisa é realizar uma revisão sistemática a respeito de pesquisas relacionadas a temática: telemedicina, telessaúde e digitalização da saúde em bases de dados, considerando o período de 2020 a 2022.

De acordo com os resultados da pesquisa, identificou-se que há necessidade de aprofundamento no estudo da telemedicina, tanto envolvendo profissionais da saúde, como usuários dos serviços. Também foi possível identificar que não há um consenso entre os pesquisadores quanto a utilização da nomenclatura, alguns estudos utilizam telemedicina e outros telessaúde, para abordar o mesmo contexto. Os estudos de modo geral, apresentaram limitação quanto a abrangência da pesquisa, considerando inclusive a necessidade de expansão.

Este trabalho contribui para a pesquisa acadêmica na medida em que aborda a discussão sobre a telemedicina sobre a perspectiva de sua aplicabilidade e com isso traz oportunidades de novas pesquisas. Esta pesquisa foi restrita a apenas três bases de dados: Scielo, Spell e Pubmed, o que pode ser caracterizado como uma limitação. Além disso, ainda não há um consenso a respeito do conceito de telemedicina na literatura, como pode-se observar nos artigos analisados, e com isso o emprego de outro termo diferente de telemedicina ou telessaúde, poderá ter extinguido algum artigo.

Diante do crescimento de pesquisas relacionadas à temática, especificadamente na área da saúde, é possível afirmar que esta é uma área de pesquisa promissora e que necessita de estudos empíricos mais aprofundados, expandindo as bases de dados, bem como os termos de pesquisa utilizados.

 

 

REFERÊNCIAS

ACCORSI, T. A. D. et al. Assessment of patients with acute respiratory symptoms during the COVID-19 pandemic by Telemedicine: clinical features and impact on referral. Einstein (São Paulo), v. 18, p. eAO6106, 2020. DOI: https://doi.org/10.31744/einstein_journal/2020AO6106.

CAETANO, R. et al. Desafios e oportunidades para telessaúde em tempos da pandemia pela COVID-19: uma reflexão sobre os espaços e iniciativas no contexto brasileiro. Cadernos de Saúde Pública, v. 36, n. 5, p. e00088920, 2020. DOI: https://doi.org/10.1590/0102-311X00088920.

CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Resolução nº 2.314, DE 20 DE ABRIL DE 2022. Define e regulamenta a telemedicina, como forma de serviços médicos mediados por tecnologias de comunicação. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 5 dez. 2022. Seção 1, p. 228. Disponível em: https://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.jsp?data=05/05/2022&jornal=515&pagina=228&totalArquivos=231. Acesso em: 20 maio 2023.

COUTO, T. M. et al. Telehealth in the pregnancy-puerperal period: complementary health strategy in a pandemic scenario. Texto & Contexto - Enfermagem, v. 31, n. 1, p. e20210190, 2021. DOI: https://doi.org/10.1590/1980-265X-TCE-2021-0190.

DOMINGUES, R. B. et al. Telemedicine in neurology: current evidence. Arquivos de Neuropsiquiatria, v. 78, n. 12, p. 818-826, 2020. DOI: https://doi.org/10.1590/0004-282X20200131.

FREITAS, B. A. C. et al. Análise dos atendimentos realizados pelo telessaúde-COVID em um município de Minas Gerais. Revista Brasileira de Epidemiologia, v. 24, p. e210036, 2021. DOI: https://doi.org/10.1590/1980-549720210036.

GARCIA SAISO, S. et al. Barreras y facilitadores a la implementación de la telemedicina en las Américas. Revista Panamericana de Salud Pública, v. 45, p. e131, 2021. DOI: http://dx.doi.org/10.26633/rpsp.2021.131.

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Recebido: 01 de maio de 2023. Aceito: 28 de junho de 2023

Correspondência: Francisca Noeme Moreira de Araújo.  E-mail: noeme_moreira@hotmail.com

Conflito de Interesses: o autor declarara não haver conflito de interesses

 

 

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