Levantamento dos mecanismos de defesa

Rev. Adm. Saúde  Vol. 17,  Nº 68, Jul. – Set. 2017

http://dx.doi.org/10.23973/ras.68.41

 

ARTIGO ORIGINAL

 

Levantamento dos mecanismos de defesa dos profissionais de enfermagem frente à deterioração das condições de trabalho

Survey of the defense mechanisms of nursing professionals in the face of deteriorating working conditions

 

Denílson Aparecida Leite Freire1 , Marisa Aparecida Elias2

 

1. Administrador e Psicólogo. Docente da Faculdade de Gestão e Negócios da Universidade Federal de Uberlândia

2. Psicóloga. Docente da Faculdade Pitágoras de Uberlândia

 

 

 

RESUMO

O objetivo desse trabalho foi investigar quais os principais mecanismos de defesa são utilizados pelos profissionais de enfermagem para lidarem com a deterioração das condições do seu trabalho. Foi realizada uma pesquisa qualitativa, por meio de entrevistas semiestruturadas, aos profissionais que atuam em um hospital escola da região do triângulo mineiro. Observou-se que a deterioração ocorre principalmente pela inexistência de equipamentos adequados, devido à rotina intensa de trabalho e à excessiva carga horária de trabalho. Apurou-se, também, que uma das fontes que alimenta a formação dos mecanismos de defesa é o caráter de devoção, abnegação e de assistência, sendo uma herança dos tempos iniciais de formação dessa profissão. O mecanismo de defesa mais utilizado é o da negação que consiste na recusa consciente para perceber fatos perturbadores. Ela retira do indivíduo não só a percepção necessária para lidar com os desafios externos, mas também a capacidade de valer-se de estratégias de sobrevivência adequadas. Torna-se necessário, assim, que a profissão deixe de ser vista apenas como um processo "artístico" para ser vista como uma profissão qualquer que valorize seus profissionais. Espera-se que esse estudo possa contribuir para o entender como esses profissionais lidam com a deterioração do trabalho e como estruturam seus mecanismos de defesa, afim de que eles possam repensar o caráter de devoção e abnegação da profissão, vendo-os como parte do trabalho, mas não como um fim, podendo buscar seu empoderamento dentro das organizações de saúde.

 

Palavras-chave: Ambiente de trabalho. Profissionais de enfermagem. Psicologia aplicada.

 

ABSTRACT

The objective of this study was to investigate the main defense mechanisms used by nursing professionals to deal with the deterioration of the conditions of their work. A qualitative research was carried out, through semi structured interviews to the professionals who work in a school hospital in the denominated state of "Minas Gerais", Brazil. It was observed that the deterioration occurs mainly due to the lack of adequate equipment, due to the intense work routine and the excessive working hours. It was also found that one of the sources that feed the formation of the defense mechanisms is the character of devotion, self-denial and assistance, being an inheritance of the initial times of formation of this profession. The most commonly used defense mechanism is denial consisting of conscious refusal to perceive disturbing facts. It removes from the individual not only the insight necessary to deal with external challenges, but also the ability to avail themselves of adequate survival strategies. It is therefore necessary that the profession is no longer seen as an "artistic" process to be seen as any other profession that values ​​its professionals. It is hoped that this study may contribute to the understanding of how these professionals deal with the deterioration of work and how they structure their defense mechanisms so that they can rethink the character of devotion and self-denial and see it as part of the work process, but not as an end and that can seek their empowerment within health organizations.

Keywords: Work environment. Nursing professionals. Applied psychology.

 

 

 

INTRODUÇÃO

Autores como Pitta (1991), Aquino (1996), Silva (1998) e Lopes (1992) confirmaram o hospital como local privilegiado para o adoecimento. O sofrimento psíquico, relata Pitta (1991), inerente ao trabalho no âmbito hospitalar, é comum a todos os profissionais que lá atuam.

Os profissionais de enfermagem, historicamente, são caracterizados pela abnegação e devotamento ao próximo. São preparados a auxiliar na recuperação dos pacientes, mas não a se preocupar com seu próprio cuidar. Aquino et al. (1993), conclui que a saúde deste grupo ocupacional se caracteriza por alta prevalência de problemas agudos e crônicos que podem refletir na ocorrência de transtornos mentais, tipo ansiedade e depressão. Os horários atípicos exigidos pelo hospital, turnos alternados, plantões, cargas físicas no constante deslocamento para conduzir pacientes, o manuseio de cargas pesadas (pacientes e materiais); a insalubridade, riscos infecciosos, parasitários e tóxicos decorrentes da pouca infraestrutura são outros problemas no trabalho hospitalar. E ainda, varizes, problemas de coluna, lombalgias, paralisias, dores, nervosismo, estresse e ansiedade aparecem como problemas de saúde comuns.

Para lidar com toda essa deterioração das condições de trabalho, esses profissionais podem desenvolver mecanismos de defesa capazes de fazê-los suportar tais situações adversas. Ignatti (2012) afirma que esse profissional acaba por desenvolver diversas estratégias de enfrentamento, sugerindo uma relação mitológica, da jornada do herói ora salvador, ora mártir, marcado pelo histórico de cunho subserviente e religioso da profissão, gerando principalmente comportamentos defensivos de isolamento, negação/despersonalização e sublimação entre outros, que perturbam as relações de trabalho e prejudicam a vida pessoal, familiar e social.

Esse artigo visou identificar os principais mecanismos de defesa utilizados por profissionais de enfermagem para lidar com a dor e sofrimento inerentes a esta atividade laboral. O ponto de partida foi pesquisa qualitativa realizada por Elias (2006), que buscou relacionar o trabalho e a saúde destes profissionais, mostrando o uso intensivo de mecanismos de defesa. Sendo assim, o presente estudo buscou revisitar o mesmo objeto, transcorridos dez anos do primeiro estudo. Visando elencar os principais mecanismos de defesa utilizados pelos profissionais de saúde de um hospital escola, foi realizada uma pesquisa quantitativa com o intuito de confirmar a frequência, intensidade e interferência de tais mecanismos no labor desses profissionais. Espera-se que esse artigo traga uma melhor percepção de como esses mecanismos se estruturam a fim de contribuir para minimização dos impactos da deterioração das condições de trabalho na saúde desses profissionais.

 

Referencial teórico

O hospital, como instrumento terapêutico, é uma invenção da modernidade. De acordo com Foucault (1984), a “consciência de que o hospital pode e deve ser um instrumento destinado a curar aparece claramente em torno de 1780”. Antes dessa transformação, os hospitais eram locais destinados à higienização da sociedade, um lugar estigmatizado pela exclusão social, onde os pobres iam morrer. Não existia a presença médica, cabendo ao pessoal do hospital o acompanhamento desses sujeitos até a morte. Aos ricos cabia a visita e intervenção médica, demarcando o caráter individualista da classe médica, destinada ao atendimento domiciliar da classe dominante.

Portanto, o hospital era essencialmente uma instituição de assistência aos pobres, para recolhê-lo e proteger aos outros do perigo que ele traz à sociedade. O pobre é alguém que deve ser assistido materialmente e espiritualmente, cabendo-lhe, apenas, receber os últimos cuidados. Assim, os indivíduos que trabalhavam no hospital não tinham como objetivo a cura, mas obterem as suas salvações eternas por meio da caridade (Foucalt, 1984).

Percebe-se que, historicamente, a enfermagem está ligada, desde suas origens, a essa noção de caridade, sendo seus primeiros executores, pessoas ligadas à igreja ou leigos praticantes dessa atitude. Esses primeiros cuidadores estavam, então, marcados pela abnegação, obediência, dedicação e devotamento. Cuidar de doentes é como garantir junto a Deus a remissão dos pecados (Rodrigues, 2001, p. 78) e essa visão de devotamento por parte desses profissionais e da sociedade persiste na contemporaneidade.

A reorganização do hospital para uma prática de recuperação se deu pela necessidade capitalista, ou seja, instrumentalizar os hospitais militares visando a cura dos soldados, mão de obra que se tornou essencialmente cara graças à necessidade de qualificação desses para manuseio de armas mais sofisticadas. E essa reorganização se deu pela disciplina, que segundo Foucalt (1984, p. 103) “é uma técnica de poder que implica uma vigilância perpétua e constante dos indivíduos.” Os espaços físicos foram reorganizados, nasceu, então, a hierarquização de funções e o médico passou a ser o principal responsável pela organização hospitalar e passou-se a exigir profissionais qualificados. Foram criadas, assim, as funções de auxiliares, técnicos e enfermeiros, focando, a partir de então, a recuperação dos pacientes.

Apesar de se tornar um espaço de recuperação, a visão do hospital como um espaço de exclusão e dor ainda persistiu, uma vez que, a partir do século XX, as pessoas passaram a cultuar a felicidade como um bem a ser conquistado a qualquer custo. Com isso, era preciso eliminar, do cotidiano, todos os eventos que trouxessem dor. Assim, percebe-se que nas diferentes famílias não se morre mais com elas, mas em hospitais, assim como o velório deixa os lares para ocorrem em locais próximos ao sepultamento, tudo com a intenção de diminuir essas experiências com a morte, tornado a morte um tabu nos dias de hoje (Caputo, 2008).

Assim, o hospital ainda é visto como um espaço de dor e sofrimento. E nesse ambiente que cabe aos profissionais a tarefa de cuidar do corpo e da dor outro, muitas vezes em detrimento das suas próprias limitações (Caputo, 2008).

O fato de a profissão ser exercida, principalmente, por mulheres contribui para aumentar as implicações econômicas sobre essa categoria de profissionais, visto que historicamente, as mulheres recebem menores remunerações que os homens. Fonseca (1996, p.71) comenta que:

 

“A força de trabalho é sexuada, sendo que o próprio trabalho possui gênero. Tal enfoque permite perceber que a estrutura patriarcal de nossa sociedade auxilia na tessitura dos campos ocupacionais, alocando sujeitos em postos mais ou menos valorizados socialmente, de acordo com seu gênero. O que determina o trabalho feminino não é o trabalho tomado a partir de suas exigências técnicas e de conhecimento, e sim, a sua posição no ranking de (des)valorização ocupacional do mercado. Assim, é o próprio trabalho que passa a ser apreciado e avaliado de acordo com os valores sociais atribuídos ao ser homem e ao ser mulher, não sendo assim, ela que o desvaloriza: a mulher tem acesso a ele e o executa por ter ele já se mostrado desvalorizado como mercadoria.”

 

Finalmente, completando o quadro, tem-se que dentro da própria área de enfermagem observa-se a hierarquização e as desigualdades de reconhecimento. Os profissionais de enfermagem parcelam suas atividades, dividindo-as entre as mais e menos graduadas. Os atos mais técnicos e socialmente mais qualificados herdados da prática médica ficam com os enfermeiros propriamente ditas, os que têm nível superior que; além de executar as tarefas técnicas, chefiam, coordenam e supervisionam o trabalho da enfermagem de nível médio e auxiliares, que por sua vez, executam o trabalho menos qualificado, expondo-se mais tempo aos enfermos. As tarefas de auxiliares e técnicos são ao mesmo tempo mais intensas, repetitivas, social e financeiramente menos valorizadas.

Dessa forma, esses profissionais estão expostos a condições de trabalho precárias que, aliadas às suas condições de vida, potencializam as possibilidades do adoecimento, levando à reflexão de que apesar de cuidarem, poucos conseguem cuidar-se (Brito, 2000).

Uma pesquisa realizada por Elias e Navarro (2006) analisou sete dimensões sobre o prazer, sofrimento e adoecimento desses profissionais. As dimensões investigadas foram: 1) o adoecer; 2) o tratamento de saúde, afastamentos, acidentes de trabalho; 3) a saúde Mental; 4) o ambiente de trabalho; 5) a rotina; 6) o trabalho e a saúde e; 7) a qualidade de vida. Os principais achados estão descritos no Quadro 1.

 

Quadro 1 – Investigação sobre condições de saúde e sofrimento dos enfermeiros.

Dimensão

Achados mais importantes

O adoecimento

Negaram ter problemas de saúde, mas no correr das entrevistas, acabaram relatando episódios de enxaqueca, stress, irritação, desgaste físico, depressão, dores nas pernas, varizes, pressão alta, como se estes não fossem problemas de saúde. A automedicação é bastante comum.

Tratamento de saúde, afastamentos e acidentes de trabalho.

Não fazem tratamento de longo prazo, alegando não conseguirem atendimento e/ou falta de tempo para o mesmo.

O desamparo no cuidado à própria saúde é vivenciado no dia a dia pelo descuido dos colegas de trabalho que atendem mal quando elas necessitam de socorro.

Os acidentes com objetos perfurocortantes são frequentes, sendo que todos eles ficaram expostos à material contaminado. Há uma banalização desses acidentes, ditos comuns, ora negando os mesmos, ora omitindo.

Saúde mental

Houve relatos de tratamento psicoterápico em algum momento de suas vidas. As causas da procura remetem a queixas de depressão e nervosismo.

Ambiente de trabalho

As relações entre os colegas de trabalho são referidas como muito boas, com um discurso de trabalho em equipe, mas referem-se também a disputas internas, rivalidades, diferenças de tratamento.

As enfermeiras relatam um ambiente melhor apesar do desgaste. As técnicas e auxiliares se queixam mais do ambiente e da diferença de tratamento para quem é concursada e contratada, uma vez que as contratadas têm salário menor, e sendo regidas pela CLT são mais pressionadas, com ameaças de demissão e corte no salário por atrasos ou faltas.

A diferença entre os funcionários contratados e os servidores federais é grande no âmbito do hospital, principalmente no que se refere ao salário.

O envolvimento com os pacientes também é citado como um importante fator de desgaste emocional, as perdas por morte são consideradas pontos negativos do trabalho.

O prazer do trabalho, em contrapartida, está na melhora do paciente, na sensação do trabalho cumprido.

Rotina

A rotina de trabalho das entrevistadas é sempre desgastante restando pouco tempo para o descanso e o máximo aproveitamento do tempo no trabalho.

Trabalho, o melhor e o pior

Ao mesmo tempo em que há uma evidente idealização do trabalho, há também a frustração pelo trabalho não reconhecido, não valorizado. O ‘trabalho de enfermagem’ é preservado pelas suas características históricas de cuidado ao outro, as causas da frustração e insatisfação ficam canalizadas para as condições de realização do mesmo. O prazer no trabalho, neste caso, está na execução de algo valorizado e reconhecido socialmente.

Saúde e qualidade de vida

O trabalho é o centro da vida da maioria delas e não tem sido capaz de proporcionar qualidade de vida. O lazer acaba se resumindo a dormir ou rezar.

 

O que se observa é que, dada a sua característica de abnegação e de servir ao próximo, esses profissionais acabam por criar mecanismos de defesa para sobreviverem a um ambiente precário de trabalho.

Dejours e Abdoucheli (1994) definem estratégias defensivas como os mecanismos utilizados pelos indivíduos para negar ou minimizar a percepção da realidade que os faz sofrer. Essas estratégias podem variar de acordo com a organização do trabalho e, por este motivo, nas diferentes categorias profissionais.

De acordo com Mendes (2007), as estratégias de defesa são construídas em consenso pela própria equipe de trabalhadores, estabelecendo um acordo tácito entre os membros para manutenção da defesa, evitando que ela se rompa e afete o equilíbrio gerado pela própria estratégia.

Essas estratégias defensivas utilizadas pelos grupos derivam dos mecanismos de defesa do ego proposto por Freud (1978) e que são:

Repressão: retirada de idéias, afetos ou desejos perturbadores da consciência, pressionando-os para o inconsciente.

Formação reativa: fixação de uma idéia, afeto ou desejo na consciência , opostos ao impulso inconsciente temido.

Projeção: sentimentos próprios indesejáveis são atribuídos a outras pessoas.

Regressão: retorno a forma de gratificação de fases anteriores, devido aos conflitos que surgem em estágios posteriores do desenvolvimento.

Racionalização: substituição do verdadeiro, porém assustador, motivo do comportamento por uma explicação razoável e segura.

Negação: recusa consciente para perceber fatos perturbadores. Retira do indivíduo não só a percepção necessária para lidar com os desafios externos, mas também a capacidade de valer-se de estratégias de sobrevivência adequadas.

Deslocamento: redirecionamento de um impulso para um alvo substituto.

Anulação: através de uma ação, busca-se o cancelamento da experiência prévia e desagradável.

Introjeção: estreitamente relacionada com a identificação, visa resolver alguma dificuldade emocional do indivíduo, ao tomar para a própria personalidade certas características de outras pessoas.

Sublimação: parte da energia investida nos impulsos sexuais é direcionada à consecução de realizações socialmente aceitáveis.

 

A elaboração de mecanismos de defesa é um recurso do psiquismo para lidar com o mal estar, sendo assim, originalmente uma forma de evitar a patologia, porém, seu uso intensivo, ao invés de ser protetivo, pode levar ao adoecimento desses profissionais. Por exemplo, ao negar um risco de contaminação, podem-se ter comportamentos de risco e se expor à mesma. Dejours (1987) ao falar sobre a psicopatologia do trabalho discute o fato de que a saúde só é possível a partir da possibilidade real de cuidar de si e de usufruir da vida, este fato parece difícil de ser realizado por quem trabalha no hospital.

Ribeiro et al. (2012) empreendeu uma pesquisa visando buscar evidências científicas sobre as formas de adoecimento pelo trabalho da enfermagem, bem como as formas para o enfrentamento e prevenção ao adoecimento e acidentes de trabalho. Utilizou-se a revisão Integrativa e a pesquisa foi realizada em bases de dados eletrônicas na área da saúde. Foi revelado na pesquisa, que os trabalhadores da enfermagem apresentam dores lombares, injúrias musculoesqueléticas, sofrem acidentes com material perfurocortante, estresse e tensão no trabalho, sofrem com poluição ambiental e dermatites. Outro estudo, conduzido por Souza et al (2011) demonstrou que as queixas de saúde mais frequentes estavam relacionadas à postura corporal (dor lombares, pernas) e à saúde mental. Entretanto, as intervenções propostas não traziam impactos na solução das formas de adoecimento. Foi percebido, também, que esses profissionais, na maioria das vezes, evitam o cuidar-se, dificultando, ainda mais, a prevenção do adoecimento,

“(...) alguns autores tentam implementar formas de prevenção e estratégias de enfrentamento para o adoecimento, mas que existe uma dificuldade muito grande de adesão aos treinamentos, cursos e intervenções propostas nos estudos, por parte dos trabalhadores da saúde.” (Ribeiro et al, 2012, p. 504)

Alguns pesquisadores interpretam erroneamente esta evitação como ato inseguro ou descuido, quando na verdade trata-se de uma forma extrema de lidar com a vulnerabilidade a que estão submetidos, é a banalização do risco. Nesta pesquisa evidencia-se, assim, outro importante mecanismo de defesa: a racionalização, fazendo com que esses profissionais, por lidarem com saúde, acreditem que não podem e/ou não estarão doentes, negando, assim, uma possível realidade, demonstrando a importância de entender com se estabelece a dialética entre o cuidar e ser cuidado na percepção desses profissionais.

 

MATERIAL E MÉTODOS

Tratou-se de uma pesquisa qualitativa, utilizando-se da técnica do estudo de caso (Yin, 2005), por meio da aplicação de entrevistas semiestruturadas. O formulário de entrevista foi elaborado a partir da pesquisa qualitativa realizada por Elias e Navarro (2006) sobre o trabalho dos enfermeiros em um hospital escola. O formulário foi dividido em quatro seções:

  • a primeira, levantando os dados de caracterização dos entrevistados, propondo um perfil para eles;
  • a segunda, enfocando a percepção dos entrevistados sobre o ambiente de trabalho;
  • a terceira, levantando a percepção sobre saúde e qualidade de vida dos profissionais e;
  • a quarta parte constitui-se de um formulário online em que se buscou avaliar os mecanismos de defesa predominantes na amostra e, para tal, foram utilizados recursos da estatística descritiva mas apenas para somatório e médias e que pudessem balizar as respostas das entrevistas. Foram categorizados oito possíveis mecanismos de defesa: negação, anulação, formação reativa, repressão, deslocamento, introjeção, sublimação e racionalização. O Quadro 2 traz uma breve descrição das afirmativas que podem constituir esses mecanismos de defesa dos profissionais de enfermagem e que foram argumentadas aos profissionais de enfermagem.

 

Quadro 2 – Descrição das afirmativas que se relacionam aos mecanismos de defesa.

Mecanismo

Variáveis (afirmativas retiradas dos depoimentos dos profissionais de enfermagem)

Negação

Você já teve ou tem problemas de saúde que afetaram ou afetam o seu trabalho.

Por várias vezes, devido a alguma situação adversa, você já se automedicou.

Você sente que, em alguma situação, evitou demonstrar que estava doente.

Você sente que não ficará doente tão facilmente, pois tem uma saúde de ferro.

Racionalização

Você já omitiu pequenos acidentes, como ferir-se com materiais cortantes, por considerá-los como eventos de pouca representação.

Você já deixou de oficializar algum acidente que ocorreu durante o trabalho.

Em várias situações você preferiu desconsiderar uma situação desagradável na sua tarefa para evitar um clima negativo de trabalho.

Você acredita que, por conhecer muito sobre doenças, é mais cauteloso no exercício da sua função.

Introjeção/Alienação

Você acredita que para atuar na sua área o perfeccionismo deve ser uma característica bem valorizada.

Você sente que para atuar na sua área é preciso ter abnegação e devoção à causa.

Você acredita que todo profissional de enfermagem deve ter a caridade como princípio norteador de suas ações.

Sublimação

Você acredita que seu trabalho lhe traz grande satisfação pessoal, mesmo não tendo reconhecimento profissional.

Você sente que emprega grande energia para o trabalho e que o resultado lhe traz paz de espírito e que esse é mais importante que a remuneração que recebe.

Você sente que é reconhecido, financeiramente e profissionalmente pela organização.

O prazer do seu trabalho está mais na recuperação dos pacientes do que na remuneração percebida.

 

Os dados foram coletados via internet por adesão espontânea dos profissionais de enfermagem do hospital escola no período de julho a agosto de 2015. Foram solicitados que atribuíssem uma nota de 1 a 5, de acordo com a escala de Likert, sendo que 1 indicava discordância total e 5 concordância total. Não se trata aqui de uma pesquisa quantitativa, mas apenas uma estratégia para classificar os mecanismos de defesa segundo a opinião dos entrevistados. Esses dados serviram para balizar as entrevistas.

 

RESULTADOS

Foram pesquisados 14 profissionais de enfermagem. O Quadro 3 apresenta um breve perfil deles, sendo relevante informar que todos são graduados em enfermagem, possuem remuneração acima de 4,5 salários mínimos e trabalham de 36 a 44 horas semanais.

 

Quadro 3 - Perfil dos pesquisados.

Indivíduo

Sexo

Idade

Estado civil

Tempo de trabalho na área da saúde

Tempo de trabalho na empresa atual

1

F

31

Casada

9 anos

4 anos

2

F

62

Casada

43 anos

33 anos

3

F

34

Casada

15 anos

15 anos

4

M

37

Solteiro

12 anos

12 anos

5

F

42

Casada

19 anos

10 anos

6

F

32

Casada

11 anos

9 anos

7

F

29

Casada

6 anos

5 anos

8

M

38

Casado

13 anos

7 anos

9

F

55

Casada

33 anos

6 anos

10

M

39

Casada

15 anos

12 anos

11

F

28

Casada

4 anos

4 anos

12

F

34

Solteira

11 anos

11 anos

13

F

29

Casada

8 anos

4 anos

14

F

41

Casada

16 anos

11 anos

 

Observa-se que 11 são do sexo feminino e 3 do masculino, 12 são casados e todos trabalham a mais de 4 anos na área de saúde, sendo que há indivíduos com até 43 anos de experiência na área o que contribui para a consistência das respostas obtidas.

Foi investigada a opinião dos pesquisados sobre as condições de trabalho, solicitando que indicassem se concordam ou não com as afirmativas, os resultados encontram-se na Tabela 1.

 

Tabela 1 - Análise da percepção das condições de trabalho.

Afirmativas

Discordam

Concordam

Total

Há equipamentos adequados para o desempenho das suas atividades

12

2

14

O clima de trabalho é adequado para o desempenho das suas funções

6

8

14

A distribuição de tarefas pela chefia é justa e adequada

8

6

14

A carga horária de trabalho é justa e adequada às suas atividades

10

4

14

O relacionamento do líder com os liderados é satisfatório

5

9

14

O relacionamento entre os membros da equipe é satisfatório

7

7

14

A rotina e a intensidade do trabalho são satisfatórias

11

3

14

Existe autonomia para o desempenho das suas atividades

8

6

14

 

Observou-se que os itens de maiores discordância são em relação à inexistência de equipamentos adequados (12), à rotina intensa de trabalho (11) e à carga horária de trabalho (10). Esses podem ser os principais estressores no desempenho da atividade desses profissionais, contribuindo para a deterioração do trabalho. Para se confirmar tais resultados, foram feitas perguntas abertas aos entrevistados sobre as principais desvantagens da profissão. As principais falas estão resumidas no Quadro 4.

 

Quadro 4 - Desvantagem em ser enfermeiro.

"Condições inadequadas de trabalho, superlotação dos serviços de saúde e carga horária elevada" (Indivíduo 3).

"Pouco ou nenhum retorno da equipe" (Indivíduo 5)

"Nenhuma no momento. gosto do meu trabalho, e depois de anos de profissão, a experiência conta muito em todos os aspectos, técnicos, profissionais, das relações interpessoais e no próprio cuidado que dispenso aos pacientes. a assistência de enfermagem é mais qualificada, pela experiência e pelo prazer do trabalho de se fazer o que se ama fazer." (Indivíduo 2)

"Falta de reconhecimento profissional, baixos salários e péssimas condições de trabalho. (Indivíduo 8)

"Trabalhar em um ambiente totalmente insalubre e aceitar isso sem protestar." (Indivíduo 14)

"Falta de recursos para implementar medidas que valorizariam as ações em meu serviço" (Indivíduo 10).

 

Em relação às essas desvantagens, observa-se que o foco não está nas pessoas, mas fora, na falta de reconhecimento e apoio pela organização.

Percebe-se que as condições de trabalho destacam-se pelo seu efeito negativo. Porém, as afirmativas que impactaram positivamente no trabalho foram o relacionamento com os líderes (9) e com o clima de trabalho (8), revelando que as relações entre os pares podem minimizar as questões de estruturas e rotinas organizacionais.

Foi investigada também, a percepção sobre a saúde e qualidade de vida. Foi utilizada a mesma estratégia de indicação de concordância ou não com os itens pesquisados. Os resultados encontram-se na Tabela 2.

 

Tabela 2 - Percepção sobre saúde e qualidade de vida.

Afirmativa

Discordância

Concordância

Total

Sinto que o ambiente de trabalho não interfere na minha qualidade de vida; não é estressante a esse ponto

13

1

14

Percebo que sinto prazer na realização das minhas atividades

5

9

14

Sinto que o trabalho interfere diretamente na minha saúde

5

9

14

Já adoeci por causa do meu trabalho

7

7

14

 

Pode-se verificar que a maioria concorda em afirmar que o ambiente interfere na qualidade de vida (13). Por outro lado, sentem prazer na atividade. Evidencia-se aqui a primeira contradição. Diferentemente da pesquisa realizada em 2003 (Elias, 2003) e publicada em 2006 (Elias e Navarro, 2006), há percepção de que o trabalho interfere na saúde mostrando um reconhecimento do agravo das condições de trabalho na atualidade. A fim de verificar quais seriam esses possíveis impactos sobre o trabalho, foi questionado aos profissionais de saúde quais eram os principais problemas de saúde decorrentes das suas atividades. Os resultados foram tabulados em números absolutos, admitindo mais de uma resposta, como pode ser visto na Tabela 3.

 

Tabela 3 - Principais sintomas decorrentes do trabalho.

Sintomas

Quantidade

Dor nas pernas

10

Ansiedade e irritabilidade

10

Alteração de humor

9

Insônia

7

Tonturas

6

Enxaquecas constantes

4

Pressão alta

3

Queda de pressão

2

Depressão

1

Desmaios

0

Outros

3

 

Percebe-se que a dor nas pernas é um sintoma físico natural da atividade já que trabalham em pé e transitando pelos corredores do hospital. Entretanto, dos três principais sintomas, dois impactam diretamente na estrutura psíquica e mental dos entrevistados, que são a ansiedade e irritabilidade (10) e alteração do humor (9) que irão refletir no físico desses profissionais, principalmente ocasionando insônia (7) e tonturas (6).

Contudo, apesar da interferência do trabalho na saúde dos enfermeiros, 9 dos 14 pesquisados afirmaram que sentem prazer na realização das suas atividades. A reflexão é: como pode esses profissionais afirmar que há impacto do trabalho sobre sua saúde e ainda assim sentirem prazer nas suas atividades? Haverá mecanismos de defesa que diminuam os impactos da deterioração das condições de trabalho nesses profissionais? Para responder a essa pergunta foi solicitado aos participantes que atribuíssem uma nota de 1 a 5 para as afirmativas que compõe os possíveis mecanismos de defesa. Para facilitar o entendimento da análise utilizaram-se os seguintes grupos:

- 1,0 a 2,4: baixa influência

- 2,5 a 3,4: média influência

- 3,5 a 5,0: alta influência

 

Em seguida foi calculada a média das afirmativas por mecanismos, resultando nos valores expressos na Tabela 4.

 

Tabela 4 - Média das afirmativas por mecanismo de defesa.

Mecanismo

Média

Negação

3,81

Sublimação

3,36

Introjeção

3,21

Racionalização

2,86

 

O principal mecanismo de defesa apurado foi o da negação (3,81). Como citado no referencial teórico, a negação consiste na recusa consciente para perceber fatos perturbadores. Ela retira do indivíduo não só a percepção necessária para lidar com os desafios externos, mas também a capacidade de valer-se de estratégias de sobrevivência adequadas.

Outro achado importante é que nenhum dos mecanismos de defesa pesquisado obteve um valor menor que 2,5, revelando que todos eles têm certa influência (forte ou média) sobre esses profissionais e que devem ser considerados na pesquisa. Dessa forma, analisando as afirmativas dos profissionais de enfermagem identificados no Quadro 3, pode-se relacioná-las com esses mecanismos de defesa e que estão expressos no Quadro 5.

Assim, tem-se que em relação à negação, ficou evidenciado, na pesquisa que os profissionais negaram terem problemas de saúde, apesar de demonstraram sinais de adoecimento e de recorrerem à automedicação. Esta ‘banalização’ é explicada por Pitta (1991) ao afirmar que o adoecer na sociedade capitalista é vergonhoso, devendo ser excluído e ocultado, porque dificulta a produção. Ainda em relação ao mecanismo de defesa negação, alguns pesquisados afirmaram que omitiram acidentes de trabalho, principalmente com materiais perfurantes e passaram a agir como se tais acidentes jamais ocorreram. Para Dejours (1988), nas situações onde o trabalhador está exposto constantemente a riscos concretos, a própria coletividade cria mecanismos de defesa para evitar a angústia e o medo.

Em relação ao mecanismo denominado alienação, percebeu-se que os profissionais aceitam diferenças de remuneração e de trabalho em função da hierarquização entre auxiliares, técnicos e graduados em enfermagem, bem como aceitam (apesar de não concordarem) pacificamente as diferenças entre os concursados e contratados. Aceitam tais diferenças não por estarem alienados, mas por que temem represálias pela organização. Outra característica marcante na alienação foi que os profissionais pesquisados demonstraram introjetar na sua rotina, a característica de perfeccionismo. O perfeccionismo é uma característica pessoal, bastante útil num trabalhador para quem o emprega. Aquino (1996) aponta que no caso do trabalho em enfermagem, a organização do tempo caracteriza-se por uma extrema rigidez, determinada pelo caráter imprescindível da continuidade da atenção hospitalar ao paciente, o que implica a necessidade, mais do que em muitas outras ocupações, de pontualidade na troca dos plantões, além do trabalho noturno e por turno.

Percebeu-se uma tentativa de sublimação no comportamento dos pesquisados quando foi revelado que os profissionais possuem consciência de que o trabalho pode influenciar sua saúde, entretanto, sentem-se realizados com o mesmo, sublimando os aspectos negativos em detrimento da valorização pessoal. Porém, quando há ganho secundário, não é sublimação, é apenas uma forma de sentir-se narcisicamente satisfeito. O termo sublimação já foi usado por Pitta (1991) e Ferraz e Volich (1998) e afirmam que a relação entre o trabalho duro e penoso do hospital e o fato dele ser ao mesmo tempo fonte de prazer e realização se justifica pela possibilidade de realizar atos valorizados socialmente, dando ao trabalhador uma sensação de prazer que pode compensar as frustrações, mesmo que momentaneamente.

No trabalho de enfermagem, a sublimação como estratégia defensiva é uma tentativa de associar a atividade com as características de benevolência da profissão. No entanto, tal tentativa é fracassada em função das condições de trabalho e deterioração das atividades, tornando-se muito mais um ato de alienação. Durante as entrevistas, essas características ficaram evidenciadas nas falas de alguns participantes, quando questionados sobre quais eram as vantagens em se trabalhar como enfermeiro. O Quadro 5 traz algumas dessas falas.

 

Quadro 5 - Vantagens em ser enfermeiro.

"Reconhecimento e gratidão dos pacientes" (Indivíduo 4)

"Sinceramente a vantagem é poder fazer o que gosta, mais infelizmente não é possível elencar aqui vantagens em atuar na área da saúde" (Indivíduo 12).

"Primeiramente poder ajudar o próximo e pesquisar as várias patologias para que sejam erradicadas ou prevenidas precocemente para que os indivíduos utilizem cada vez menos o ambiente hospitalar." (Indivíduo 6).

"Cuidar das pessoas" (Indivíduo 9).

"Há pessoal qualificado, que tem vontade de ajudar as pessoas e que venham dispostas a trabalhar e não estarem na área de saúde pela remuneração." (indivíduo 13).

 

Todas as vantagens apontadas pelos participantes se referiam ao cuidado com o outro. Em nenhuma fala foi apontada, como vantagem, o sucesso na carreira, ou o retorno financeiro, nada que demonstrasse um caráter mais individualista. Isto demonstra o caráter benevolente e de abnegação, uma herança secular da profissão, que pode ser evidenciada pelas falas dos pesquisados quando questionados sobre quais as principais características pessoais para se trabalhar na área de saúde. E esse trabalho, visto dessa forma, pode estar influenciando a manutenção de mecanismos de defesa que, apesar de terem como função proteger e trazer equilíbrio mental para os profissionais de saúde, podem também minimizar a luta de classes e submete-los às condições precárias do trabalho hospitalar. As principais afirmativas estão descritas no Quadro 6.

 

Quadro 6 - Características pessoais para se trabalhar na área da saúde.

"Impessoalidade, paciência, poder de escuta, saber gerir conflitos, interesse e força de vontade." (Indivíduo 2)

"Dedicação, responsabilidade, pontualidade e estudar continuamente." (Indivíduo 7)

"Profissionalismo e humanização" (Indivíduo 1)

"Amor ao próximo, dedicação, compreensão e ter equilíbrio emocional" (Indivíduo 3)

"humildade e vontade de novos conhecimentos" (Indivíduo 14)

"conhecimento técnico e cientifico e cordialidade" (Indivíduo 11)

 

Neste quadro, pode-se ressaltar o caráter alienado dos depoimentos. Presos no discurso ideológico da profissão, vemos repetir elementos da pesquisa anterior que ressalta a manutenção de uma visão messiânica da atividade laboral, que ata o profissional a condições precárias e o responsabiliza pelo trabalho realizado. Percebe-se, assim, que a profissão é mais vista como uma arte, no sentido do cuidado no fazer, do que uma ciência, incomodando apenas um dos entrevistados:

"Nosso trabalho deveria ser visto realmente como uma profissão como qualquer outra. Me irrita esta história de arte, quem faz arte é artista. Enfermagem deveria ser vista como uma profissão, uma ciência e assim por adiante. O fato de ser vista como arte desvaloriza o seu papel." (Indivíduo 5).

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo desse trabalho foi levantar a percepção dos profissionais que atuam como enfermeiros sobre as condições de trabalho e quais os principais mecanismos de defesa desenvolvidos por esses para lidar com a deterioração da atividade.

Observou-se que a deterioração ocorre principalmente, na percepção do grupo investigado, pela inexistência de equipamentos adequados, devido à rotina intensa de trabalho e à excessiva carga horária de trabalho. Apesar disso, eles consideraram como pontos positivos o relacionamento com os líderes e um bom clima de trabalho em geral, revelando que estes elementos podem minimizar os efeitos dessa deterioração. Isso pode ser comprovado pela dicotomia apresentada nas respostas sobre qualidade de vida, em que eles afirmaram que o trabalho influencia negativamente sua qualidade de vida, entretanto sentem prazer na sua profissão. Essa dicotomia pode ser explicada pelos mecanismos de defesa que são gerados para enfrentar essa deterioração, destacando-se o de negação e o de sublimação. Revela a tentativa de preservar o bem estar profissional.

Observou-se, também, que uma das fontes que alimentam a formação de tais mecanismos é o caráter de devoção, abnegação e de assistência, sendo uma herança dos tempos iniciais de formação dessa profissão. Isso é evidenciado pela excessiva preocupação desses profissionais para cuidar do outro e para não cuidar de si mesmo, procurando um melhor posicionamento de mercado. Assim, torna-se necessário que a profissão deixe de ser vista apenas como uma prática cuidadora, como a de um "artista" para ser vista como uma profissão qualquer que valorize seus profissionais.

Esse estudo possui, entretanto, algumas limitações. A pequena amostra dificulta a generalização das questões aqui levantadas, ampliando-as para um público maior, porém, é coerente com estudos anteriores. Outra limitação diz respeito ao estudo ter sido realizado em um hospital escola, cuja cultura pode se diferir de outros tipos de hospitais.

Contudo, tais limitações abrem novas oportunidades de estudo, como, por exemplo, efetuando-se uma pesquisa em um público maior e de outros segmentos, efetuando-se uma comparação de resultados. E, por fim, sugerem-se estudos longitudinais para verificar se tais mecanismos perpetuam nas organizações.

Espera-se que esse estudo possa contribuir para o entendimento de como esses profissionais lidam com a deterioração do trabalho e estruturam seus mecanismos de defesa, afim de que eles possam repensar o caráter de devoção e abnegação da profissão, vendo-o como parte do trabalho, e não como um fim, podendo buscar seu empoderamento dentro das organizações de saúde.

 

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Recebido: 17 junho 2017. Publicado: 12 julho 2017

Correspondência: Denilson Freire. Rua João Velasco de Andrade, 382. Uberlândia-MG. CEP 38408-202. E-mail: denilson.freire@hotmail.com

Conflito de Interesses: os autores declararam não haver conflito de interesses

 

 

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